Estância recorre à inovação para superar problemas causados por alagamentos no RS

Sobressemeadura com avião agrícola garante pastagem de cerca de 1.300 touros da raça Braford após as enchentes que atingiram o estado
Estância Luz de São João locou avião para realizar a sobressemeadura - ARQUIVO PESSOAL, CELSO JALOTO
Estância Luz de São João locou avião para realizar a sobressemeadura - ARQUIVO PESSOAL, CELSO JALOTO

Em maio de 2024, devido às fortes chuvas no Rio Grande do Sul, todos os gaúchos viveram um pesadelo que durou meses, ainda reflete no cotidiano de milhares pessoas e se perpetuou em suas histórias. Até mesmo aqueles que não foram atingidos diretamente, acabaram sendo impactados de alguma forma. Na Estância Luz de São João, localizada em São Gabriel, fronteira-Oeste do estado, os alagamentos atrasaram o plantio da pastagem de mais de 1 mil touros da raça Braford, dando espaço para a inovação, tecnologia e economia atuarem na alimentação dos animais, que serão ofertados em leilão no dia 10 de setembro.

Durante a Expointer, o proprietário da estância, Celso Jaloto, de 72 anos, conta como ele e a esposa, Magda Jaloto, foram atingidos pelas fortes chuvas e os recursos que garantiram o bom estado corporal. “A gente não teve enchentes e inundações, como se viu na região de Lajeado e Porto Alegre. O que nós tivemos foram alagamentos em algumas áreas de pastagens, mas não todas”, explica, descrevendo o cenário da Estância Luz de São João no mês de maio, após dias de chuvas no estado. Preocupado com a preparação dos animais para o leilão e a condição climática que impedia a plantação da pastagem de inverno, Jaloto diz que a família teve a ideia de fazer a sobressemeadura (plantação de pastagens anuais de inverno sobre a pastagem perene de verão) com avião agrícola. “Nós ainda tínhamos 200 hectares de soja plantada, portanto, usamos o avião para semear o azevém por cima desta soja que ainda não havia sido colhida. A ideia é a própria soja proteger as sementes de azevém, e após a colheita, o pasto estar com mais ou menos 10 centímetros de altura.” Celso ainda explica que o azevém é uma pastagem de inverno muito usada no RS, com alto poder nutricional e muita proteína, e melhora o desenvolvimento do animal.

Celso Jaloto, de 72 anos, superou os desafios trazidos pelas fortes chuvas de maio de 2024 com técnica de sobressemeadura – NATHÁLIA JUNG/BETA REDAÇÃO


INVESTIMENTO FINANCEIRO
Para colocar a ideia em prática, foi necessário tempo, estratégia e investimento financeiro. O diretor da Grifo Aviação Agrícola, Leonardo Kaczmarck, empresa contratada pela estância para executar o serviço de sobressemeadura, diz que vale a pena o investimento para acelerar a engorda dos animais e colocá-los no mercado de forma antecipada. “O custo da aviação varia de acordo com a distância da lavoura até a pista de decolagem e quantos quilos vão ser semeados por hectare, devido ao rendimento por voo.” Leonardo afirma que o valor cobrado pela aviação também é proporcional à demanda e ao momento econômico dos animais. “Em 2023, o valor médio cobrado, por uma vazão de 30 quilos por hectare e uma pista razoavelmente perto, girou em torno de R$ 70”, completa o diretor da empresa de aviação agrícola.

Celso Jaloto conta que para cobrir com azevém os 200 hectares de plantação de soja, foram investidos R$ 3 mil por tonelada e gastos 150 quilos por hectare, o que resulta em quase R$ 90 mil. Além disso, foram R$ 26 mil destinados à aplicação de ureia na plantação da pastagem, pois a cada hectare eram mais R$ 130. “Era mais econômico colocar a ureia com trator, como eu já fazia. Porém, eu não tinha como entrar com o veículo, iria estragar toda a pastagem porque estava úmida e afundava.”

Parte da área de pastagem foi afetada pelos alagamentos – ARQUIVO PESSOAL, CELSO JALOTO


TEMPO DE DESENVOLVIMENTO DA PASTAGEM
O tempo era outro empecilho, já que a entrada dos animais no pasto poderia ser feita somente após dois meses de cuidados e trabalhos na plantação da pastagem, para que ela pudesse crescer e surtir efeito na nutrição dos animais. Durante esse período, o proprietário pensou em adiar o leilão, já que aproximadamente quatro meses separavam o início da plantação até o dia 10 de setembro, data que os touros Braford serão ofertados. “Enquanto estávamos semeando o azevém, os animais estavam em campo nativo, se alimentando com feno pré-secado, que eu já tinha, sal proteico energético e outras áreas com ração”, explica o proprietário da estância, relatando como alimentou os animais logo após os alagamentos nas áreas de pastagens.

Um dos pontos críticos do trabalho de semear sobre a soja é o desenvolvimento do pasto. “Não bastava eu colher a soja, pois a pastagem ainda estava curta no primeiro mês. Com pouca luminosidade, nestes dias chuvosos e sem sol, não há fotossíntese e a planta não se desenvolve sozinha”, afirma Celso. Um mês após a sobressemeadura, realizada com o avião agrícola, a soja foi colhida pelos três funcionários que trabalham na Estância da família, então, chegou a vez de aplicar a ureia (fertilizante nitrogenado que contém amônia e gás carbônico) no pasto que já estava com cerca de 10 centímetros de altura.
Técnico de agropecuária e inspetor técnico da Associação Brasileira de Hereford e Braford, Emmanuel Cabral explica que esse tipo de semeadura e os produtos aplicados não impactam negativamente na alimentação animal. “Esta ferramenta de sobressemeadura é importante, pois consegue antecipar de 15 a 20 dias a utilização da pastagem. Isso também antecipa a entrada dos animais nestas áreas e melhora a resposta deles, que chegam saudáveis e com o peso que a gente considera ótimo para a oferta de animais.” Cabral também explica que a função do sal proteico energético, utilizado na pastagem dos touros enquanto a colheita da soja ainda não havia sido feita, é otimizar os ganhos de peso e o desempenho da pastagem na nutrição animal. “Enquanto a pastagem normal engorda um touro da raça Braford cerca de um quilo por dia, a utilização do sal proteico energético permite o ganho de até um quilo e meio por dia, dependendo do animal”, afirma o técnico de agropecuária.

Depois de investir em novas técnicas para contornar dificuldades geradas pelas enchentes, Celso Jaloto aguarda pelo retorno financeiro. A Beta Redação perguntou ao proprietário se ele estava esperançoso para a oferta dos animais. “Olha, a média por um touro da raça Braford em um leilão é de mais ou menos R$ 18 mil. O quanto vai sair do meu leilão, no dia 10 de setembro, depois eu te digo, respondeu Celso, com um sorriso confiante no rosto. 

A Estância Luz de São João, em São Gabriel/RS, possui cerca de 1.300 touros da raça Braford e é gerenciada por Celso e sua esposa Magda – NATHÁLIA JUNG/BETA REDAÇÃO

Gabriel Muniz Ribeiro

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