Por João Pedro Mendoza, Rafael Renkovski, Taiana Souza, Valentina Lopardo e Vitória Ribeiro*
Em uma determinada fase da vida, sair da casa dos pais pode significar um alívio e um pontapé inicial para a independência financeira. A tendência, no entanto, é que essa decisão seja tomada cada vez mais tardiamente. Ao menos em Porto Alegre. Conforme dados divulgados no relatório de maio do Índice FipeZap, em comparação com a renda mensal de pessoas entre 18 e 24 anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o valor médio de aluguéis na capital gaúcha representa 75% da renda média dos jovens que residem na cidade.
Por metro quadrado, o valor médio geral na Capital é de R$ 33,50, segundo o índice. Em contrapartida, os dados atualizados da Pnad do primeiro semestre de 2024 mostram que a renda média mensal na faixa etária analisada é de R$ 1.874. Considerando o padrão dos imóveis do programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, que é de 42 m², sem contabilizar os gastos condominiais e contas básicas de moradia, o preço médio do aluguel é de R$ 1.407, absorvendo três quartos do salário recebido pelos jovens.
Realidade em outras capitais
Das 11 capitais brasileiras analisadas pela reportagem, Salvador é a que o jovem recebe o menor salário: média de R$ 1.273. Lá, o aluguel médio gira em torno de R$ 1.561. Se um jovem de Porto Alegre recebesse o salário de um jovem de Salvador, não seria o suficiente para pagar mensalmente uma moradia padrão de 42 m².
Na região Sul, em Curitiba, apesar de o salário médio dos jovens ser maior do que na capital gaúcha, o aluguel médio também acompanha, tornando a situação semelhante. Em Florianópolis, o alto custo de aluguel se destaca, mas a conjuntura se equilibra com a alta renda, no valor médio de R$ 1.954. O mesmo ocorre com a maior metrópole do Brasil, São Paulo, onde o salário médio dos jovens é de R$ 2.016, mas o aluguel médio é de R$2.285.
Diferença entre bairros
Na zona Sul de Porto Alegre, o bairro Nonoai é considerado o mais barato para se alugar um imóvel. Os valores das moradias são menores neste bairro do que nas regiões mais baratas de pelo menos seis outras capitais: Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Goiânia. Comparando com Fortaleza, Recife e Brasília, porém, estão acima.
Ainda na capital gaúcha, a diferença entre os valores no bairro mais barato e no mais caro – Praia de Belas -, é de, aproximadamente, 142%. Nas outras capitais do Sul, as distâncias são significativamente menores: em Curitiba é de quase 50% e, em Florianópolis, 64%.
Não sobra muito no final do mês
Thiago Palada, de 24 anos, vive em uma situação confortável financeiramente. Com três fontes de renda, consegue tirar cerca de R$ 5 mil mensais. O aluguel de seu apartamento na zona Norte de Porto Alegre custa R$ 1,25 mil, fora os gastos fixos de R$ 1 mil. Para a jovem Cláudia Sant’Anna, de 21 anos, também. Recebendo um salário em torno de R$ 3,5 mil, paga, entre aluguel e despesas com a casa, cerca de R$ 1,9 mil mensais, na zona Norte da capital gaúcha.
Apesar de morarem sozinhas, outras duas jovens têm os gastos mais apertados. Mãe solo, morando com a filha de um ano, Júlia Garcia recebe em média R$ 3 mil de salário, mas gasta R$ 2,2 mil com moradia, também na zona Norte. Em uma região próxima, Rafaela Moreira, de 21 anos, vive situação semelhante, gastando 70% da renda mensal com aluguel e contas do apartamento.
Leandro Borges, de 19 anos, é um exemplo claro da realidade do jovem que precisa encarar a independência, mas com o auxílio de terceiros. Com o ensino médio completo e uma paixão pela mecânica, ele decidiu deixar sua cidade natal para buscar curso técnico no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de Porto Alegre, inexistente em seu município de origem.
“Atualmente estou desempregado e trabalhando de maneira autônoma, fazendo pequenas manutenções residenciais, mas continuo procurando emprego na área que gosto, mecânica”, relata.
A necessidade de um curso específico e a falta de oportunidades impulsionaram sua mudança para a Capital, mas o custo de vida se mostrou um obstáculo significativo. Sem conseguir se manter financeiramente sozinho, Leandro depende do apoio financeiro de seus pais para sobreviver em Porto Alegre. “Eu busco uma vida melhor, mais ampla, com mais conhecimentos em minha área e almejando trabalhar futuramente no que eu gosto”, explica.
A expectativa de Leandro para os próximos meses é encontrar um emprego que atenda suas necessidades financeiras e permita que ele trabalhe na área que ama. No entanto, com os altos custos de aluguel sugando grande parte da renda média dos jovens, a independência financeira parece um sonho distante para muitos.
“As dificuldades são evidentes”, diz presidente do Creci-RS
Para Naor Lagoas, presidente do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis do Rio Grande do Sul (Creci-RS), as dificuldades enfrentadas pelos jovens ao buscar sua primeira moradia são evidentes, mas algumas empresas imobiliárias adotam medidas para facilitar o acesso, como a flexibilização de exigências de fiadores e comprovação de renda. “No entanto, isso varia conforme o interesse do mercado local”, comenta Lagoas.
Para o presidente do conselho, o custo-benefício para os jovens locatários é determinado pela localização, o que caracteriza como “crucial”: “Opções mais acessíveis em áreas remotas podem comprometer a qualidade de vida pela distância de locais de estudo e trabalho”.
Sobre a influência de eventos climáticos extremos como as recentes enchentes nos preços de aluguéis, Lagoas acredita que não terá um aumento significativo, já que as áreas afetadas frequentemente acabam não sendo atrativas para os jovens. “Estamos observando um crescimento na oferta de imóveis com espaços reduzidos, adaptados para o trabalho remoto, o que visa reduzir custos e otimizar investimentos”, conclui.
*Reportagem produzida na atividade acadêmica de Jornalismo de Dados (supervisão: Taís Seibt)