O “conselho do leitor” é exigente

Leitores apontaram diversas sugestões de melhoria na primeira rodada de matérias da Beta Geral

Em um domingo a noite, pouco antes das 21h, fui surpreendido com a ligação da aposentada Claudia Vargas. A leitora achava que seria melhor conversar por telefone para explicar sua avaliação sobre o texto da Beta Geral que pedi para ela ler. Ficamos 30 minutos naquela conversa. Ali percebi que se iniciava, oficialmente, minha rotina de ombudsman da Beta Geral.

Em 1989, o jornal Folha de São Paulo inovou no Brasil como primeiro veículo de imprensa a criar o cargo de ombudsman com o objetivo de evidenciar suas falhas e aumentar a relação com os leitores. “Já se mostravam necessárias ações de caráter interno e externo que comprovassem que a Folha buscava melhorar a qualidade informativa do jornal”, diz trecho da Tese de Doutorado “A função enunciativa do ombudsman da Folha de S. Paulo”, de Sabrina Franzoni.

Durante minhas pesquisas para entender melhor o que precisava alcançar sendo o ombudsman da Beta Geral da Unisinos, também me deparei com o trabalho de Rodrigo Westphalen durante a mesma atividade em 2022. “São discussões construídas a partir dos textos para pensarmos as diversas formas de aprimorar o trabalho de reportagem e continuarmos eternamente questionando o estado atual das coisas”, relata Rodrigo em sua segunda coluna.

Meus colegas tiveram uma semana para realizar sua primeira matéria para a Beta Geral. Tudo em meio à Sexta-feira Santa e a Páscoa – um terror para jornalistas que precisam contatar o poder público, por exemplo. Mesmo assim, entre estresses e correrias, publicamos a maioria das matérias no período previsto.

A partir disso, selecionei seis pessoas – muito críticas e observadoras – para formar o Conselho do Leitor do primeiro semestre de 2024. Então, começo minha jornada como ombudsman, ficando sob minha responsabilidade repassar as mais sinceras opiniões de nossos leitores – torcendo também para ainda ter amigos ao final do semestre. Então vamos lá!

Dificuldades com o final

A repórter Nadine Dilkin conseguiu encontrar um case fenomenal para sua matéria. Uma mulher que, depois de vencer o câncer, pedalou por 119 dias pela Patagônia. Porém, o “pecado” do texto está no final, como mencionou a leitora Claudia Vargas na sua avaliação. “Fiquei na expectativa pelos sentimentos da ciclista durante a viagem. O parágrafo final é curto para expressar tudo que ela sentiu. No fim, quero saber porque a ciclista não ficou ansiosa”, destaca.

Sintia Weber durante sua viagem de bicicleta. Foto: Sintia Weber/Arquivo Pessoal.

Cláudia achou o texto fácil de compreender, mas também apontou algumas falhas na gramática. “O parágrafo que fala de Puerto Natales está confuso de entender. Em outros momentos percebi algumas repetições de palavras, como no trecho: ‘conta a irmã. Porém, a decisão foi tomada durante o tratamento. Gracieli conta que (6° parágrafo)’.” A leitora ainda sugere um menor uso da palavra “pois”, optando, como alternativa, por outros sinônimos.

o texto do colega Arthur Reckziegel foi elogiado no arquivo – extremamente detalhado – enviado por Renata Karoline Kehl, mestranda em comunicação, após analisar a produção.

“Gostaria de parabenizar o autor pela escolha da temática. É um assunto relevante, atual e, principalmente, urgente pelo que traz a luz em seu texto”, pontua.

Renata também observou possibilidades de melhoria na matéria. Para ela, o primeiro parágrafo está muito denso. “Talvez a reportagem possa iniciar com algo mais sucinto, apresentando o contexto ou alguma situação que ilustre como o zolpidem é ‘sedutor, atrativo e perigoso’.” A mestranda sentiu falta de um parágrafo de fechamento e de amarração da discussão apresentada ao longo da reportagem.

No texto do Arthur também vale a atenção para a utilização de hiperlinks. O trecho “o último mapeamento realizado pela OMS” não leva para o destino desejado.

O empresário Régis da Rosa gostou bastante do Projeto Ponto Ecopedagógico mencionado no início do texto de Michele Alves. “Mas depois, quando vai para uma parte mais geral, entendo que o tema fica meio cansativo e disperso. Fui perdendo o interesse na leitura porque começaram a aparecer mais siglas nacionais, estaduais e municipais”, avalia.

A cereja do bolo no texto da Michele seria um exemplo de uma casa de aluno onde a família adotou o processo da reciclagem. Seria o fechamento do ciclo escola, aluno e família.

Mais atentos que o restante da mídia

Apesar do Dia Nacional do Sistema Braille ser celebrado em 8 de abril, a grande mídia não produziu muitos textos sobre o assunto. Diferente do que fez Eduarda Cidade em sua matéria. Apesar de eu ter notado alguns parágrafos longos demais, a repórter agradou ao abordar um tema importante sobre acessibilidade. Eu sempre me pergunto como é possível aprender o Sistema Braille, me parece muito difícil. Mas, através da matéria, consegui entender melhor sobre o processo.

O coordenador de Políticas Públicas para Pessoa Idosa na Prefeitura de Novo Hamburgo, Telmo Silva, analisa que “o texto, além de claro e objetivo, é abrangente e esclarecedor a respeito do valor do uso do Braille”. Além disso, as fotos ajudaram a enriquecer o conteúdo.

Foto: Marilena Assis/ACERGS

Outro ponto positivo vai para o texto de Gabriel Jaeger, sobre a inclusão dos alunos com autismo. Na última semana saiu a notícia sobre autorização, por parte do Governo de São Paulo, para que a família pague ou exerça função de auxiliar nas escolas nos casos de alunos com deficiência. Desde então, veículos como O Globo e Uol publicaram matérias sobre a inclusão de estudantes autistas. Mas, antes desses veículos, veio o texto da Beta Redação.

Mesmo assim, alguns trechos não passaram batido para a estudante de Letras Manuela Tarouco. No primeiro parágrafo está escrito: “A Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Novo Hamburgo busca incluir as crianças e adolescentes das 91 escolas de educação básica”. “Incluir onde? Incluir no que?”, questiona a leitora. Para ela, duas vírgulas também deveriam ser retiradas no segundo parágrafo: uma depois de “(TEA)” e outra antes de “ainda estão”.

“Ótima essa introdução”

Em sua matéria, Luísa Bell foi até o Centro de Sáude IAPI e conseguiu boas fotos autorais para ilustrar o conteúdo. Neste caso, Manuela Tarouco elogiou bastante o começo do texto. “No primeiro parágrafo ficou ótima essa introdução. Ao mesmo tempo foi bem informativa para contextualizar as pessoas logo no início.”

Vacinação no Centro de Saúde IAPI. Foto: Luísa Bell/Beta Redação

Porém, um detalhe no último parágrafo novamente não passou batido pela estudante de Letras. Durante o trecho “A campanha de vacinação vai até 31 de maio e o Dia D, na qual ocorrem os mutirões”. “Seria ‘no’ qual, porque é ‘o’ dia D”, corrige.

Aspas e parágrafos longos

Eu gostei bastante do uso de trechos entre aspas destacados no texto do Dominik Machado. Faz a diferença na matéria, principalmente na quebra entre parágrafos. O leitor Leonardo Lienemann, estudante de Nutrição, destacou positivamente os dados dos animais abandonados, as fotos das iniciativas e os requisitos para a adoção.

Pelo lado negativo, o Leonardo citou a sonoridade do título. “Poderia trocar ‘ONGs e projetos da causa animal’ por ‘ONGs e iniciativas da causa animal’.” Ele também achou que poderia constar a chave pix das ONGs ao final da matéria.

De modo geral, cabe destacar que percebi alguns repórteres se empolgando na escrita em alguns parágrafos, o que deixa a experiência cansativa para quem lê pela internet. O mesmo vale para citações muito longas entre aspas.

Cuidem a disposição das imagens, galera!

Mesmo que lidar com o wordpress não seja tão intuitivo, me incomodaram nessa primeira publicação da Beta Geral algumas matérias com imagens mal colocadas ao longo do texto. Em alguns casos, as fotos não ficaram centralizadas no centro da tela. Em outras situações, foram utilizadas imagens verticais ocupando muito espaço. Precisei rolar bastante o scroll do mouse para voltar a encontrar texto. Seria melhor fazer como a imagem de exemplo colocada ao lado desse parágrafo. Por fim, atenção à leitura dos gráficos, para que o leitor não precise dar um grande zoom para visualizar os dados.

(Imagem: Freepik)

Conheça o Conselho do Leitor

Claudia Vargas, 59 anos, viúva, possui uma filha. Nasceu em Canoas, mas atualmente vive em São Leopoldo. É formada em Educação Física. Durante a sua vida atuou na área de formação, além de ter sido bancária por muitos anos. No momento está aposentada.

Leonardo Lienemann, 24 anos. Desde que nasceu é morador de Canoas. Atualmente é estudante de Nutrição da Unisinos e faz estágio na área.

Manuela Tarouco, 20 anos. Nasceu e reside em Novo Hamburgo. No momento é estudante de Letras da Unisinos e faz estágio na área.

Régis da Rosa, 61 anos, é casado e possui dois filhos. Nasceu em São Leopoldo e, atualmente, vive em Capão da Canoa. É graduado em Publicidade e Propagando pela Unisinos. No momento atua como empresário.

Renata Karoline Kehl, 29 anos. Nasceu em Novo Hamburgo e ainda reside no município. É graduada em Relações Públicas e, atualmente, é mestranda em comunicação pela UFRGS.

Telmo Silva, 86 anos, possui um filho. Nasceu em Porto Alegre e, atualmente, reside em Novo Hamburgo. É formado em Psicologia e atuou por diversos anos como professor universitário. No momento trabalha como coordenador de Políticas Públicas para Pessoa Idosa na Prefeitura de Novo Hamburgo.

Gustavo Bays

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