Foi com a camiseta ensopada de sangue, depois de levar um chute na boca em sua primeira aula de taekwondo, que Gustavo Sartori Schneider teve certeza de que o caminho das artes marciais era o seu destino. Aos 12 anos, após uma breve passagem pelo karatê, foi apresentado ao taekwondo e, mesmo com a boca cortada, encontrou ali uma paixão e um propósito. “Eu queria ter superpoderes”, relembra, falando das fantasias de infância. Inspirado pelos heróis dos seriados japoneses e filmes de ação da TV Manchete, Gustavo descobriu nas artes marciais algo ainda mais profundo: a disciplina, o autocontrole e a perseverança.
Atualmente com 42 anos, Gustavo construiu uma trajetória notável que transformou tanto sua vida quanto a de muitos ao seu redor. Começando como voluntário em uma escola no bairro Três Pinheiros, em Gramado, dedicava suas manhãs de sábado para ensinar taekwondo às crianças que não tinham condições de pagar pelas aulas. “Eu trabalhava durante a semana, estudava, mas o sábado de manhã era delas”, conta. Com o tempo, o projeto foi crescendo e, com o apoio das Damas de Caridade e de entidades locais, o sonho de Gustavo ganhou mais estrutura: tatames, raquetes e equipamentos começaram a compor as aulas. Hoje, ele atende 350 crianças e adolescentes no contraturno escolar.
Esse trabalho se transformou no projeto social “Guerreiro da Pena e da Paz”, uma iniciativa que não só ensina técnicas de taekwondo, mas também busca formar cidadãos. “O juramento do taekwondo fala em cortesia, integridade, perseverança, autocontrole e espírito indomável”, explica Gustavo. Esses valores, que ele absorveu na própria jornada, se tornaram a base de suas aulas e sua missão.
Sua dedicação foi além do papel de professor. Gustavo também construiu uma carreira como atleta de destaque. Entre seus títulos estão o Campeonato Brasileiro de 2014 e o Intercontinental de 2011. Ele também competiu duas vezes em Mundiais na Coreia do Sul, em 2013 e 2022. No entanto, afirma que sua maior conquista não está nos pódios, mas nas lições transmitidas aos alunos. “Hoje vejo ex-alunos trazendo os próprios filhos para treinar comigo. Eles querem que seus filhos aprendam os valores que eu ensinei”, conta, orgulhoso.
Em meio aos desafios financeiros e à falta de incentivo ao taekwondo e outras modalidades esportivas no Brasil, Gustavo reflete sobre o apoio que hoje recebe de entidades como a Câmara de Vereadores e a Secretaria Municipal de Esporte e Lazer. Ele acredita que, se tivesse o apoio que há hoje, poderia ter alcançado voos ainda mais altos em sua carreira esportiva. “Mas é uma questão cultural: o Brasil ainda é o país do futebol”, diz ele, realista, mas sem perder o otimismo para o futuro.
Casado com Daiane, Gustavo é pai de três filhos. Ana Clara, de 16 anos, e Renato, de 18, também são faixas-pretas e o acompanham desde pequenos nas competições e eventos. A caçula, Rafaela, com apenas seis anos, ainda não começou a treinar, mas ele deixa claro que a escolha será dela. “Se ela quiser fazer balé ou futebol, que seja. A gente sempre tentou unir a vida familiar com a arte marcial, porque ocupa bastante tempo”, comenta.
Gustavo acredita que o mundo digital afasta as pessoas do contato humano e vê nas artes marciais uma ferramenta para resgatar essa conexão. “Vejo o taekwondo como uma forma de restabelecer o vínculo social e afetivo. As pessoas precisam do olho no olho, do convívio real”, reflete. Para o futuro, seu grande desafio é ampliar o projeto e formar novos faixas-pretas e professores que possam continuar seu legado.
Em seus mais de 30 anos nas artes marciais, Gustavo é hoje um mestre faixa-preta 5° Dan de taekwondo, além de ter graduação em hapkido e Arnis Kali. Para ele, o taekwondo foi uma escolha de vida, um caminho de superação e, sobretudo, de transformação. Ao olhar para o passado, ele se vê como o garoto que queria “superpoderes”. E, ao olhar para o presente, vê-se como alguém que encontrou na arte marcial um propósito maior: o de inspirar a nova geração para o futuro.