O município de Montenegro-RS, no Vale do Caí, completou 152 anos em maio. A “Cidade das Artes” teve comemorações com um período de festas com shows de artistas do estado como a banda Hatfield, Os Lagranha, além de apresentações nacionais como Dilsinho e Fernando e Sorocaba. Também foram realizadas outras atividades, como exposição de obras na Estação da Cultura.
A cidade possui diversos locais com destaque para a cultura como Estação da Cultura, com espaço para exposição de artistas, CTG, TV Cultura do Vale, Fundarte, Campo Renner Futebol Clube, Câmara de Vereadores (espaço de exposições de arte), entre outros. Apesar disso, 22 anos após adotar o título, “Cidade das Artes” ainda faz sentido?

Montenegro adotou o título em 2003, ano em que a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS) se instalou no município. A partir de 17 de julho daquele ano, o então prefeito Ivan Jacob Zimmer assinou a lei que deu o título para Montenegro.
Desde 2022, a universidade optou por deixar Montenegro e os cursos passaram a ser ofertados em Porto Alegre. Ficaram somente as turmas que já estavam abertas para que os alunos pudessem concluir suas atividades.

A cultura acontecendo
A diretora de patrimônio histórico de Montenegro, Daiane Almeida de Azevedo, destacou a importância de um espaço como a estação da cultura para a divulgação de obras: “Ele é importante porque a gente consegue manter e cultivar esse nome “Cidade das Artes”. É um museu em que temos exposições tanto de montenegrinos quanto de pessoas de fora”.
Ela falou sobre o sentimento que muitas pessoas, principalmente de Montenegro, têm sobre não ver sentido no título para o município “Infelizmente não são todos que entendem o porquê que a gente tem esse nome. As pessoas dizem: ‘Ah, que arte, se a gente não vê arte nenhuma’. Mas a gente tem vários espaços hoje”.
Daiane ainda reforçou as legislações que auxiliam os artistas a conseguirem se manter e também destacou a importância da UERGS nesse caminho: “Essa universidade foi muito importante, para gente poder evidenciar ainda mais os nossos artistas”.
O diretor-executivo da Fundarte, Rodrigo Endres Kochenborger, também falou à reportagem da Beta Redação. Rodrigo destacou o papel da Fundarte, que desenvolve projetos nas áreas de dança, música, artes visuais e teatro. Sobre Montenegro, ele destacou a sua visão da cultura na cidade: “Penso que seja um dos mais ricos que exista, proporcionalmente falando. Levando em conta o número de habitantes da cidade, o volume de pessoas que desenvolvem algum tipo de arte é gigantesco. Dados da Secretaria de Cultura, informam que há quase 400 artistas cadastrados na cidade”.
Ele também destacou o papel da Fundarte. A instituição possui mais de 900 alunos efetivos e outros 300 em projetos com escolas e outros espaços. A escola também com uma revista acadêmica classificada pela Capes, com qualis A1, a mais alta qualificação. Possui um teatro com capacidade para 165 pessoas, Além de uma Galeria de Arte Contemporânea que promove um Salão de Arte, com mais de 500 inscritos nas duas ultimas edições. Também conta com uma TV que é voltada à Arte, Cultura e Educação
O diretor-executivo, que também é artista, disse se sentir plenamente representado pelo título “Cidade das Artes”, devido a todo movimento artístico que ocorre na cidade e seu entorno: “Várias pessoas de Montenegro têm relevância no cenário artístico cultural do estado e do país, saindo daqui para tocar, dançar, atuar e expor sua produção artística em grandes centros”.

HENRIQUE KIRCH/BETA REDAÇÃO
Além disso, ele destacou que ex-alunos da Fundarte lecionam em todos os lugares do mundo: “Temos ex-alunos da Fundarte que são professores universitários, atuando em nível de graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado em várias universidades, todos com o viés da arte! Então, sim, Montenegro é a Cidade das Artes”.
A visão do artista
Michele Martines, 43 anos, faz doutorado em Arte Visual, trabalha com arte e pesquisa em pintura, fotografia e instalação. No dia em que conversou com a reportagem, ela estava terminando de expor suas obras na Estação da Cultura.

HENRIQUE KIRCH/BETA REDAÇÃO
Michele destacou a importância do museu na cidade. “Eu acho fundamental! Me orgulho de a gente ter um museu. Claro, a gente quer sempre que as condições sejam as melhores possíveis, tem bastante coisa a melhorar”. Michele destacou a necessidade de cobrar dos gestores, que estão sempre mudando, para que os espaços estejam em condições.
Mas ela reforça que Montenegro é um município privilegiado: “Mas eu acho que Montenegro é privilegiado por ter um espaço da Estação, assim como outros”.

Michele também abordou o fato de muitos não entenderem o motivo do título “Cidade das Artes”: “Acho que a gente está num caminho. Como artista, eu adoro esse título”. Mas reforçou a necessidade de colocar artes nas ruas. Lembrou de uma obra dela mesma na rua Buarque de Macedo, onde os orelhões passaram a ter um formato de frutas cítricas. Apesar dessa falta de obras na rua, ela destacou que Montenegro está buscando concretizar esse título.
A artista ainda ressalta a importância de mecanismos de incentivo como a Lei Paulo Gustavo e Lei Rouanet, pois, segundo ela, ajudaram a levar a cultura para os municípios do interior e não ficar só nos grandes centros.
Percepção da comunidade
Erick Kohl, 24 anos, morador da cidade, vê o cenário cultural de Montenegro como fraco, mesmo tendo a Fundarte como referência: “Fora a Fundarte, não tem outro lugar para se aprender e participar da arte, e no meu caso já realizei uma pesquisa para aprender um instrumento musical e procurei por professores de instrumentos por fora e encontrei um ou dois, mas com uma agenda totalmente lotada”.
Também disse sentir falta de mais obras e decorações na rua: “Tratando-se da cidade em especial, é bem deprimente, para se falar a verdade, comemorações de datas importantes não parecem acontecer na cidade, muito pela falta de uma decoração elaborada”.
Ele ainda disse que, em sua visão, o título não faz sentido para o município: “Não me faz sentir isso, durante a escola não lembro de nenhum colega ou pais de colegas que sabiam tocar algum instrumento, ou algum escritor entre a população e muito menos alguma exposição de artes anual ou algo parecido, o que eu já vi que tem é uma feira de artesanatos ou de livros que acontece algumas vezes ao ano na praça da cidade”.