Crianças e adolescentes de regiões com altos índices de vulnerabilidade social tem acesso a computadores, PlayStation 5, óculos de realidade virtual e kits de volante e pedal em Novo Hamburgo.
O projeto GamePlay da Prefeitura Municipal de Novo Hamburgo atende crianças e adolescentes fornecendo acesso à tecnologia, jogos digitais e internet desde 2021. Os computadores de mesa que estão dispostos lado a lado nas sedes do projeto agora dividem espaços com videogames de última geração e televisores de 50 polegadas.
Com recursos do Ministério Público do RS (MPRS), a iniciativa intersetorial adquiriu os novos equipamentos e fechou contrato com o Senac para fornecimento de oficinas gratuitas de empreendedorismo e carreira aos jovens.
Em torno de 80 crianças são atendidas em três bairros da cidade, nas Bases Comunitárias de Ação Integrada (BACI) Santo Afonso e Kephas, no Centro de Artes e Esportes Unificados (CEU) da Boa Saúde e no Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) Kephas.
“É um projeto intersetorial, que se realiza com vários saberes”, conta a assistente social Rúbia Geane Goetz, da Unidade de Gestão de Programas de Prevenção à Violência (UGPPV) da Secretaria de Segurança. Integradamente, participam as secretarias de Administração, Desenvolvimento Social, Cultura e Esporte e Lazer, além da diretoria de Comunicação.
“Existia uma lacuna na oferta de projetos para adolescentes no município… projetos atrativos”, complementa Rúbia, ao reforçar que a população de pré-adolescentes e adolescentes muitas vezes tem resistência a adesão em propostas mais tradicionais.
A assistente social explica que, para atrair este público, é necessário oferecer algo que os interesse. “Hoje, é importante que a gente consiga ofertar algo relacionado à tecnologia e aos jogos”, afirma Rúbia.
Em uma pesquisa de 2019 feita pela Fundação Semear, em Novo Hamburgo, com 570 adolescentes, 42,3% dos entrevistados responderam que tem como atividade do tempo livre “navegar na internet”. E outros 33,3% disseram “jogar online”. Ambos os percentuais são maiores do que os de quem pratica esportes (31,6%), dizem “fazer nada” (18,6%) ou ficam na rua com amigos (16,5%).
Ao mesmo tempo, dados do Observatório de Segurança do município mostram que entre 2017 e junho de 2022, jovens de 14 a 17 anos somavam 87,8% das vítimas de homicídios tentados/consumados contra menores de idade. Nos dados nacionais do Atlas da Violência, 48,4% das mortes de jovens entre 15 e 19 anos foram por homicídio, o maior percentual de todas as faixas etárias.
Segundo Rúbia Goetz, não é possível ainda mensurar o impacto do projeto nos dados de violência, mas é possível perceber resultados positivos. “Buscamos gerar um vínculo entre os adolescentes na tentativa de prevenir a violência, trabalhando diversas questões a partir dos games. Mas eles não vão só jogar. Eles recebem orientações sobre comportamento, convivência, além de entrar em contato com as oficinas”, explica.
Captação para Oficinas e Equipamentos
Rúbia foi a pessoa responsável por escrever o projeto apresentado ao MPRS no início deste ano. Foram captados R$ 105 mil. Deste valor, R$ 66 mil foram destinados à compra dos equipamentos, R$ 31,9 mil às oficinas do Senac e o restante para as camisetas do projeto.
Segundo o coordenador de iniciativas em inclusão digital, Lucas Backes, da Diretoria de Inclusão Digital da Secretaria de Administração, esta foi a primeira vez que o MPRS destinou verbas de uma multa, originada no município, como retorno para um projeto do município. “É uma experiência. Eles pediram um projeto, nós apresentamos, eles aprovaram e a verba veio vinculada. Agora, vamos prestando contas conforme o andamento”, contextualiza.
O objetivo secundário do projeto é aproximar a comunidade de jovens de outras políticas públicas e oportunidades ofertadas por diferentes secretarias. A CEU Boa Saúde, por exemplo, possui cineteatro, quadras poliesportivas, pista de skate, biblioteca e disponibiliza oficinas de capoeira, dança tradicionalista gaúcha, desenho, violão, teatro e futsal, além de outras atividades. No outro lado da cidade, a BACI Santo Afonso oferece aulas de inglês e música.
Visita à BACI Santo Afonso
A Beta Redação visitou a BACI Santo Afonso na sexta-feira, 24/11, durante o horário de funcionamento do GamePlay. Fomos recebidos pelo estagiário Pedro Henrique Petry de Faria, de 25 anos, estudante de Ciências da Computação.
Há quase dois anos monitorando jovens no projeto, Pedro conta como o contato com estas tecnologias gera, além de entretenimento, competências. “No início, eles chegam sem saber usar um teclado… e, por estarem jogando, podem até não perceber isso, mas eles já sabem mexer em computadores melhor do que grande parcela da comunidade”, diz Pedro Henrique.
O Playstation 5 (PS5) não estava ligado no dia. “Por enquanto, opera só em um dia da semana, nas segundas-feiras”, disse o monitor. Segundo explicou, a ideia é incentivar o uso dos computadores. Aqueles que estiverem ativos nos outros dias podem jogar o PS5.
“Tem alguns que tem uma boa qualidade de vida, mas tem alguns que participam e não tem ninguém em casa essa hora. Não tem nem o que lanchar em casa”, comenta Pedro Henrique. No projeto, é servido lanche para todos.
A situação dos jovens pode ser, por vezes, bem desamparada. Isso se demonstra mais claramente em algumas ocasiões. No dia 9/12, os participantes do projeto serão levados para um passeio até a Dreamfest, uma convenção Geek na PUC-RS. “Uma das dificuldades, para ter uma ideia, é que muitos não tem RG, uma exigência para viagens intermunicipais”, comenta Lucas Backes. “Na verdade, tivemos até caso de pessoa sem certidão de nascimento.”, complementa.
Para a Beta Redação, os jovens participantes da BACI Santo Afonso elogiaram o projeto e disseram amar os lanches. Segundo eles, o único problema é que, com o crescimento do número de participantes, eles estão podendo jogar menos. “Antes eu achava que precisávamos de computadores melhores”, comenta Pedro. “Agora, eu vejo que precisamos é de mais computadores, mesmo que dessa mesma qualidade… precisamos atender mais gente”, diz.
A maioria dos participantes, mesmo não tendo computador em casa, já gostava de jogar pelo celular. E a faixa etária média é de, aproximadamente, 11 anos.
Backes explica que a demanda, até então, vem sendo por parte de pessoas mais jovens do que o planejado inicialmente. “Nós notamos que o projeto acabou atraindo uma gurizada mais jovem, então abrimos para crianças a partir de 10 anos”.
“Nós temos dois mais velhos, de 14 e 15 anos, que vêm aqui às vezes. Mas eles moram mais longe”, comentou Pedro. Segundo contou, os de mais idade acabam saindo. “Por exemplo, um dos participantes parou de vir porque fez 14 anos e, então, teve que começar a trabalhar”.
Campeonato de e-Sports
Um consenso entre todos entrevistados, crianças e adultos, foi a excelência do 2º Campeonato GamePlay de Jogos On-line, realizado no sábado, dia 28/10, na Casa das Artes, no centro de Novo Hamburgo. A competição começou com classificatórias nos próprios polos do projeto, e os melhores competiram presencialmente.
“Lá foi nossa primeira experiência de campeonato juntando todos os membros no mesmo espaço”, conta assistente social Rúbia. Foi estruturada uma ilha com 10 computadores, os PS5 foram colocados ao redor e ocorreram simultaneamente as competições de Roblox Driving Empire e FIFA 2023. “Tentamos dispor para eles o que estamos querendo oferecer: inclusão. Um ambiente de campeonato de e-Sports que inclui uma pessoa da comunicação narrando a final”.
Os campeões levaram troféus para os seus respectivos centros, que, agora, sediam o início de uma história de esportes eletrônicos disputados entre crianças e adolescentes das periferias de Novo Hamburgo. O próximo campeonato está previsto para ocorrer em dezembro, mas os detalhes ainda não foram divulgados.
Serviço
Para ingressar no projeto, é necessário procurar uma das sedes do projeto.
BACI Santo Afonso
Endereço: Rua Buenos Aires, nº 217, bairro Santo Afonso.
Telefone: 3600-3262
BACI Kephas
Endereço: Rua Arthur Momberger, nº 1072, bairro Vila Diehl.
CRAS Kephas
Endereço: Rua Tamoio, nº 52, bairro Vila Diehl.
Telefone: 3524-1375
Praça CEU
Endereço: Rua do Bosque, nº 1303, bairro Boa Saúde.
Telefone: 3582-4736
Outras informações, acesse: https://www.novohamburgo.rs.gov.br/semad/game-play
Por: Rodrigo Westphalen