47 anos de Brique da Redenção, diversidade e memórias afetivas 

A clássica feira a céu aberto de Porto Alegre atrai todos os tipos de público para curtir os domingos na Redenção

Localizado na extensão da Avenida José Bonifácio, o Brique da Redenção foi criado em 1978 por um grupo de profissionais do ramo de antiquários que tinham a vontade de expor os seus produtos e desenvolver atividades. De acordo com Renita Stieler, presidente da Comissão Deliberativa dos expositores de antiquários do Brique da Redenção, o objetivo inicial era justamente ter um espaço para poder comercializar antiguidades e afins, inspirado em modelos consolidados como a Feira de São Telmo de Buenos Aires, na Argentina, e o Mercado de Pulgas de Montevidéu, no Uruguai. 

Realizado todos os domingos e considerado patrimônio cultural do Estado desde 2005, o Brique está muito presente na vida dos porto-alegrenses. Com o recente aniversário de 47 anos da feira comemorado em março, a equipe de reportagem da Beta Redação foi ao Brique em um domingo ensolarado, atrás de histórias de expositores, artistas e do público que circulava pelo local.   

Em um domingo ensolarado, o Brique da Redenção recebe moradores e turistas entre bancas de arte, antiguidades e artesanato. EDUARDA CIDADE/ BETA REDAÇÃO 

Um local que respira arte e cultura 

Reunindo de veteranos a novatos, o grupo de expositores é dividido em quatro segmentos: antiquários, arte na praça, artesanato e gastronomia. Renita explicou que para participar do Brique é preciso se inscrever no edital publicado pela prefeitura. “Quando tem boxes vagos, eles se inscrevem nesse edital e fazem uma prova que se chama triagem. Após isso, os que são selecionados com as melhores notas e produtos, ainda passam por um período de teste, para verificar se ver se eles mantêm o mesmo nível de produtos anunciados na triagem, se cumprem o horário, ou seja, cumprem com o regramento”, afirmou a presidente.  

Há 39 anos no Brique, o artista plástico Silvio Sheuca, de 69 anos, relatou que fazer parte da feira foi muito importante para sua trajetória por ser um grande ponto cultural da cidade. “Foi uma forma de eu entrar em contato diretamente com as pessoas, para explicar, expor o meu trabalho, a minha arte, além de ter servido como uma vitrine para divulgar os meus cursos na época em que eu ministrava”, ressaltou ele. Silvio ainda falou que sempre teve um bom retorno do público, em sua maioria pessoas de média e alta renda, e que 95% das suas vendas ao longo dos anos de sua carreira vieram do Brique. Quando perguntado sobre o que o local representa para ele, destacou a conexão. “O Brique da Redenção é cultura, é um lugar que todas as pessoas deveriam conhecer, conviver para ter a experiência de entrar em contato com os expositores”. 

 

O artista plástico Silvio Sheuca, de 69 anos, destaca a feira como um espaço fundamental de conexão com o público e divulgação de sua arte. EDUARDA CIDADE / BETA REDAÇÃO 

Já Amanda de Mello Barbosa, de 35 anos, que estava expondo esculturas e utensílios de cerâmica do seu Ateliê Violeta, relatou que aquele era o seu primeiro dia no Brique da Redenção e que já havia feito amizades com outros expositores. “Eu já pude ter uma experiência com a feira de sábado, que assim como várias outras também tem dias que são muito legais e outros que são um pouco mais fracos. Mas o Brique é uma feira diferente das outras, é maior, e participar dela está sendo uma boa experiência, pois ter acesso aos outros artistas e ter essas trocas tem sido bem rico também”, afirmou Amanda. 

Em seu primeiro dia no Brique da Redenção, Amanda de Mello Barbosa, expõe peças de cerâmica do Ateliê Violeta e celebra as trocas com outros artistas como parte da experiência. EDUARDA CIDADE/ BETA REDAÇÃO 

Ela ainda disse que o público estava sendo muito receptivo com a sua arte: “É um público que vem passear e admirar, independentemente de quem passava por aqui, jovem ou mais velho, todos param para admirar as peças e compartilhar opiniões”. Para Amanda, o Brique representa cultura, acessibilidade e diversidade.  

Histórias inusitadas e memórias afetivas 

O expositor Silvio Sheuca relatou que já presenciou várias histórias divertidas no Brique, mas segundo ele a mais inusitada foi quando um casal disse ter se inspirado em uma de suas obras. “Ah, são muitas. Uma, por exemplo, eu estava expondo um painel, que eu faço painéis escultóricos, e era um casal com a mulher se envolvendo por cima do homem. E aí o casal olhou, gostou e compraram. Aí um tempo depois eles me relataram que foi assim que eles tiveram a primeira relação deles, que começou assim”.   

Já Renita Stieler disse ter uma conexão pessoal com o Brique da Redenção, porque tem ligação com o seu casamento na igreja Santa Terezinha, localizada em frente à Redenção. “Eu conheci o Brique no último domingo de janeiro de 1982, quando fui ter uma reunião com o padre, sobre o casamento. Quando acabou, fui pegar uma lotação, na Avenida João Pessoa, aí eu acabei tendo contato com os expositores que já estavam expondo há quatro anos no Brique e me encantei, mas naquela época a minha cabeça estava voltada para o casamento. Sei que se passaram uns oito ou nove meses depois de casada, eu voltei lá para visitar a feira. Então, desde 1983 eu frequento o Brique da Redenção como consumidora, como admiradora”, contou Renita. 

Mas foi em 2018 que ela entrou para o núcleo de expositores do Brique, depois de passar um domingo na feira ajudando uma amiga a se estabelecer lá. “E aí veio o edital. Aí eu conversei com a minha amiga, e disse: ‘Ó, tu tem que te inscrever, é a tua chance, mas eu vou me inscrever também. Eu tenho certeza que é isso que eu quero’. E a assim foi, minha amiga foi aprovada, eu fui aprovada e me tornei uma expositora do Brique e uma defensora ferrenha dos expositores que lá estão”, contou a presidente do conselho.   

Passeando pela feira com o filho pequeno Francisco Scorza e o marido Lucas Dutra, a psicóloga Alice Scorza, egressa da Unisinos, conta que sempre tem o costume de ir ao Brique da Redenção desde a infância. “Eu tenho muitas memórias afetivas, desde as roupas da Barbie, do parquinho e da pipoca na infância com meus pais. Depois na adolescência, memórias de ir ao Bar do Lago, das rodas de chimarrão com os colegas da universidade”, destacou ela. 

Alice relatou que mantém essa tradição de passar os domingos no Brique por conta do filho e afilhados, que adoram o local. “A gente vem com frequência, aí aproveitamos para almoçar por perto, algo que a gente adora. E tem uma coisa também que nos encanta muito, que é o empreendedorismo local, algo que acho superimportante valorizar e a gente vem por isso e para passear com o nosso filho também”, afirmou.   

Alice aproveita os domingos no Brique da Redenção com o filho e o namorado, valorizando o empreendedorismo local e os momentos em família. EDUARDA CIDADE/ BETA REDAÇÃO 

Para a enfermeira Cristina Silva, de 53 anos, que passeava com a tia aposentada Lenir Silva, o Brique é um ambiente familiar e acolhedor que dá para trazer os pets, além de olhar os produtos e fazer um lanche. “Eu moro aqui em Porto Alegre há 30 anos, então tenho várias lembranças afetivas de vir aqui com a minha mãe, pois nós morávamos na esquina, então a gente vinha todo domingo passear aqui”, relembrou Cristina.   

Cristina Silva, 53 anos, e a tia Lenir aproveitam o domingo no Brique da Redenção. Para a enfermeira, o local é um espaço afetivo e acolhedor, repleto de boas memórias em família.  EDUARDA CIDADE/ BETA REDAÇÃO 

De braços abertos à diversidade 

Quando questionados sobre como definiriam o Brique da Redenção em poucas palavras, todos os entrevistados, sem exceções, escolheram a palavra diversidade, sendo utilizada em todos os seus sentidos. Para Cristina, é diverso no sentido de encontrar de tudo no local. “Tu encontra tudo aqui, tudo é permitido, assim. Todas as pessoas vêm aqui”, apontou ela. Já Alice Scorza destacou, além da diversidade, a familiaridade, e nomeou o Brique da Redenção como “Porto Alegre raiz”. A novata expositora Amanda de Melo Barbosa descreveu a feira como diversidade e cultura.  

Para todo o lado víamos alguma expressão de arte. Uma roda de capoeira em frente ao Monumento ao Expedicionário, mais conhecido como Arco da Redenção, um artista pintando um quadro ou esculpindo, um artista de rua tocando gaita ou então fazendo malabarismos e até figuras carimbadas do Brique como o Anjo da Redenção, estatua viva interpretada por Abraham Ponce.   

Lipsen, conhecido como “O Gaiteiro do Brique”, leva música e performance teatral aos frequentadores da feira, unindo arte e entretenimento nas manhãs de domingo. EDUARDA CIDADE/ BETA REDAÇÃO 

Ou seja, o Brique da Redenção é um ponto de encontro democrático e inclusivo em que todos podem se manifestar da sua forma, além de ser também um passeio totalmente gratuito, em que todos os tipos de grupos podem aproveitar do espaço em família, com amigos ou sozinho. O Brique se estabeleceu como um movimento cultural vital da cidade muito presente na vida dos gaúchos, embalando as manhãs e tardes de domingo da capital.  

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