Castello Branco, Costa e Silva e Médici figuram nas fachadas das instituições municipais e estaduais

No ano em que o Golpe Militar completa seis décadas, as cidades de Porto Alegre, Caxias do Sul, Canoas, Pelotas, Santa Maria, Viamão e Novo Hamburgo, além de outros 30 municípios gaúchos, ainda possuem 38 instituições de ensino que destacam em suas fachadas nomes de presidentes atuantes durante a Ditadura Militar brasileira, que ocorreu entre 1964 e 1985, torturou 20 mil pessoas e deixou 434 desaparecidos segundo a organização internacional Human Rights Watch.

O levantamento realizado pela Beta Redação usou como base dados atualizados em 2022 pela Secretaria de Educação do Estado. Nele constam os nomes de Humberto de Alencar Castello Branco, Arthur da Costa e Silva e Emílio Garrastazu Médici como patronos das instituições. Os outros dois dos cinco presidentes do período militar, Ernesto Beckmann Geisel e João Figueiredo, não titulam nenhuma entidade.

Homenagem ou registro contextual?

A partir do levantamento, a reportagem da Beta entrou em contato com cinco entidades para conferir o processo de nomeação das instituições de educação.

A Escola Estadual de Ensino Fundamental Castelo Branco*, de Frederico Westphalen, e o Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva, de Porto Alegre – ambos fundados em 1968 -, não souberam informar o motivo das nomenclaturas que ostentam em suas fachadas.

Já a Escola Municipal de Ensino Fundamental Castelo Branco, de Cruz Alta, informou que foi fundada em 1949 com o nome de “Cristo Redentor”, mas, em 1976, foi denominada “Grupo Escolar Castelo Branco”, justamente em homenagem ao ex-presidente do período militar.

Fundada em 1945, a Escola Estadual de Ensino Médio Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, de Santa Maria, está localizada próxima a quartéis do exército. Mas para a diretora Ana Lúcia dos Santos, o nome de registro da entidade faz parte da história da instituição e a permanência dele não configura uma homenagem aos feitos do marechal.

“Houve um motivo para registrá-la assim, e valorizar e respeitar a história dos lugares, das pessoas, dos acontecimentos é também um ato educativo. Além disso, há todo um trabalho descentralizador e democrático que a gestão da escola faz junto à comunidade escolar, e também o trabalho didático-pedagógico da equipe docente”, analisa Ana Lúcia.

A diretora reforça que nas aulas de história, Castello Branco é trabalhado como uma figura dentro de seu contexto. “Os fatos históricos são analisados de maneira crítica e com a veracidade que a educação exige”, pontua.

A Escola Estadual de Ensino Médio Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco está localizada na região central de Santa Maria. Foto: Google Maps.

Já em Sarandi, o Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva, criado em 1968 com o nome “Grupo Escolar junto ao Parque Minuano”, passou a se chamar – por decreto editado em 1970 – de “Grupo Escolar Presidente Arthur da Costa e Silva”, conforme documento obtido pela Beta Redação que conta a história da escola. No material, Costa e Silva é identificado como “um dos principais articuladores do Golpe de 1964”.

‎Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva em 1975, sete anos após sua fundação. Foto: Arquivo institucional

Iniciada na residência de uma professora, em 1977, por um grupo de moradores que comprou um terreno em Santo Antônio da Patrulha, a Escola Estadual de Ensino Fundamental Castelo Branco hoje pertence à prefeitura. Em 1979, o município cedeu o terreno ao governo estadual. Com o decreto n° 28.768 de 11/05/79, a instituição passou a se chamar “Escola Estadual de 1° Incompleto Presidente Castelo Branco”. Atualmente, chama-se “Escola Estadual de Ensino Fundamental Presidente Castelo Branco”, conforme portaria de alteração realizada em 2001.

A Escola Estadual de Ensino Fundamental Castelo Branco, em Santo Antônio da Patrulha, traz o nome do presidente militar em faixa e canteiro central. Foto: Facebook/Reprodução

Quem eram os ex-presidentes?

Humberto de Alencar Castello Branco

Castelo Branco foi o primeiro presidente da ditadura

Um dos principais articuladores do golpe que derrubou o presidente João Goulart, em 1964, o marechal foi eleito presidente da república de forma indireta, pela Junta Governativa Provisória, em 15 de abril do mesmo ano. Durante sua gestão, que durou até 1967, foi criado o aparato legal que buscava legitimar o endurecimento do regime militar. Manifestações contra o governo resultaram em intervenções em sindicatos, escolas e universidades, detenções e prisões indiscriminadas. Durante sua gestão, foram criados o Serviço Nacional de Informações (SNI) – órgão responsável por adquirir e compilar dados contra opositores do regime militar -, e a Emenda Constitucional no. 9 que, entre as medidas, prorrogava o mandato do presidente. Castello Branco também decretou diversos Atos Institucionais, como o AI-2, que instituiu o fim do voto direto para presidente e vice-presidente; o AI-3, que determinou o fim da eleição direta para governadores – e na qual os prefeitos seriam escolhidos pelos governadores; e o AI-4, que convocava o Congresso Nacional para votar uma nova Constituição.

Arthur da Costa e Silva

Costa e Silva governou de 67 a 69

Nascido em Taquari, no Rio Grande do Sul, em 1899, ocupou diversas funções durante sua passagem no exército. Atuou como comandante do 9° Regimento de Infantaria sediado em Pelotas e foi chefe do Estado-Maior da 3ª Região Militar, entre outros cargos. Assim como Castello Branco, foi um dos articuladores contrários ao presidente João Goulart. Foi ministro da guerra até assumir a presidência em 1967, ficando no cargo até 1969. O início de sua gestão foi marcado por intensos movimentos políticos, pois aumentava a resistência contra o regime, sobretudo por estudantes que denunciavam a falta de verba na educação e eram contrários ao projeto de privatização do ensino público. Foi durante a gestão de Costa e Silva que foi criado o Ato Institucionail n° 5, o AI-5, que aumentou os poderes do presidente e é considerado o mais elaborado mecanismo de repressão do período. O AI-5 permitia o fechamento do Congresso, a suspensão dos direitos políticos e garantias constitucionais, a intervenção federal nos estados e municípios, e a demissão e a aposentadoria de funcionários públicos, entre outras medidas.

Emílio Garrastazu Médici

Médici esteve no poder de 1969 a 1974

Nascido em 1905, na cidade de Bagé, no Rio Grande do Sul, ocupou diversos postos como Tenente do 12º Regimento de Cavalaria, em sua cidade natal, e Comandante da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), em Resende, RJ. Médici também apoiou o golpe contra João Goulart e assumiu a presidência em 1969. Seu mandato foi um dos mais repressivos contra a oposição ao regime, pois fez vigorar o AI-5. A gestão ficou marcada pela extrema repressão política, censura aos meios de comunicação e tortura aos opositores, que passaram a aderir à luta armada. A gestão Médici, então, transferiu o comando das operações repressivas para a recém-criada Operação Bandeirantes (Oban), em São Paulo, que passou a se chamar Comando de Operações de Defesa Interna (CODI) e coordenava as atividades dos Departamentos de Operações e Informações (DOIs). A gestão Médici, que durou até 1974, foi a responsável por grande parte das mortes, prisões e exílios durante a Ditadura Militar.

Informações e imagens dos ex-presidentes foram extraídas do portal da Biblioteca da Presidência.

* Grande parte das escolas nominadadas Castello Branco ostentam a grafia equivocada do nome do ex-presidente, com apenas um L. Para atender ao registro contextual, a Beta Redação manteve a grafia utilizada na fachada das entidades ao longo da matéria.