Posto de coleta para doação de sangue em Parobé atende 44 hospitais gaúchos
Michele Alves
O material é enviado para o Hemocentro de Porto Alegre, e pode salvar milhares de vidas
O Posto de coleta da cidade de Parobétem chamado atenção de outros municípios, pois vem conseguindo suprir a demanda de bolsas de sangue necessárias em vários hospitais do RS.
De acordo com o Ministério da Saúde, aproximadamente 1,4% da população brasileira doa sangue, o que representa 14 pessoas a cada mil habitantes. O SUS recebe 3.159.774 milhões de doações por ano – muito pouco, quando se leva em consideração as diferentes situações em que o sangue é o recurso essencial para salvar vidas.
Inaugurado em agosto de 2023, o Posto de Parobé registrou mais de 200 doadores só no primeiro mês, e mais de 1,5 mil bolsas de sangue entregues, desde sua abertura até o mês de abril de 2024. Os voluntários vêm de diferentes regiões e cidades do Vale do Paranhana e garantem que a praticidade e o bom atendimento do local fazem toda a diferença.
De geração em geração
Em outubro de 1983, Ivanete e Vilmar Fernandes tiveram o seu primogênito, Alessandro. Mas, a felicidade do casal se transformou rapidamente em incerteza e medo. Os pais de primeira viagem notaram que havia algo errado com o filho e procuraram ajuda médica. Logo após passar pela consulta de triagem, a equipe percebeu que, para obter respostas, e pela complexidade do caso devido a idade do bebê, o menino deveria ser internado.
Com o passar dos dias, ao observar que o quadro clínico do seu filho só piorava, Vilmar ficava ainda mais ansioso. A equipe não sabia com que tipo de enfermidade estava lidando para poder realizar o tratamento adequado.
Nem o pediatra e a equipe médica responsável pelo extinto Hospital Faioque, da cidade de Taquara, conseguiam amenizar a situação para o casal. O pai ainda recorda a frase infeliz do doutor no seu momento de maior aflição.“Caso as coisas não saiam como o esperado, não se preocupem, vocês ainda são jovens e podem ter outros filhos”.
Semanas depois, o menino de pouco mais de sete semanas de vida, foi diagnosticado com uma infecção intestinal complexa que se agravou rapidamente. Nos primeiros dias de internação, os cuidados foram redobrados e foi indicado um tratamento de emergência. O bebê ficou internado na UTI neonatal, teve convulsões, foi reanimado várias vezes, e ainda enfrentou um coma de três dias.
Os médicos perceberam que transfusões de sangue seriam necessárias, mas havia mais um empecilho. Alessandro tinha um tipo raro de sangue, O-, cujo doador é compatível com todos, mas só recebe de pessoas da mesma tipagem. A mãe, mesmo sendo O- também, não podia doar, por estar se recuperando após o parto, e no período de amamentação.
Ivanete e Vilmar trabalhavam na época em uma empresa calçadista, que estava em expansão na região. Foi lá, em meio a muita procura, que conseguiram a doação de sangue para o filho entre chefes de setor, funcionários e empresários de outras cidades.
O final dos anos 1980 foi um período delicado para a prática da doação de sangue no Brasil, devido a epidemia de AIDS. As doações que já eram poucas, estavam ainda mais restritas para evitar transmissão do vírus HIV na transfusão de sangue.
Outros tempos
Hoje a doação tem sido cada vez mais estimulada pelo poder público, e o voluntariado tem surpreendido com o volume arrecadado. O cuidado com todo o processo, através de exames e critérios técnicos, garante que ele ocorra de maneira segura para quem doa e para quem recebe a doação.
A motivação para requisitar um ponto de coleta ao Hemocentro de Porto Alegre e a instalação dele em Parobé veio de Lucas Fernandes, filho mais novo do casal Fernandes, irmão de Alessandro. O servidor público, de 30 anos, cresceu ouvindo o pai falar do acontecido com o irmão mais velho.
Lucas era o encarregado pela organização da doação de sangue e do transporte dos conterrâneos de Parobé para a capital gaúcha. Ele observou que os ônibus ficavam lotados de doadores. Foi quando decidiu criar o projeto do Posto de Coleta de Sangue e o apresentou à gestão municipal, que imediatamente abraçou a ideia. Ele conta que o deslocamento e a distância costumam ser as causas de muitas desistências.
Uma iniciativa assertiva
Os números têm comprovado o sucesso da ação. Duas vezes por semana as cadeiras ficam lotadas. Os cuidados para o bem estar do doador vão desde o agendamento, passando pela triagem quando chegam na recepção, e até após a doação, quando são encaminhados para a sala de recuperação. Lá, repousam, se hidratam, recebem um lanche fornecido pelo posto, e são monitorados por enfermeiros por pelo menos 15 minutos, para só então, serem liberados.
Segundo Lucas Fernandes as doações são pré-agendadas, e o processo é fácil e rápido para que o voluntário volte em outro momento. Cada pessoa pode doar 450 ml de sangue por vez, que deve ser retirado entre cinco e 12 minutos. O tempo e o volume de sangue variam de acordo com a pressão sanguínea de cada pessoa. Mulheres podem doar a cada 90 dias, já os homens, a cada 60.
A enfermeira Marivane Silva Souza, 42 anos, responsável pelo Posto de Coleta de Parobé, reforça que o processo de doação é pensado para ser eficaz e prático. “É bem rápido, são, em média, 40 minutos. A pessoa vai chegar na recepção, fazer a triagem, depois a doação, passa para a sala de recuperação e vai embora”, afirma.
Diferencial e relevância do Posto de Coleta
Uma novidade do posto de Parobé é o medidor de biosinais, um equipamento portátil que otimiza o tempo e a precisão no exame de parâmetros necessários para saber se a pessoa está apta para doação no dia da coleta. O aparelho mede a hemoglobina, a contagem de células vermelhas e a saturação sanguínea, de forma não invasiva e garantindo ao voluntário um exame indolor.
As bolsas de sangue coletadas em Parobé são armazenadas em coolers com temperatura de 20º a 24º, processo que não ocorre em todos os postos. Em seguida, são levadas no mesmo dia por agentes de saúde do Hemocentro até Porto Alegre.
Há pressa para que as bolsas de sangue cheguem à capital. Todavia, no posto de coleta há um refrigerador para garantir a temperatura necessária de armazenamento em caso de imprevistos. No início de 2024 o posto de Parobé chegou a disponibilizar um espaço ao Hemocentro, devido a falta de energia após um vendaval, o que evitou a inutilização de centenas de bolsas de sangue.
De pai para filho
Valdomiro José Pereira, 69 anos, morador de Rolantinho, é doador de sangue há meio século. O agricultor residente no distrito da cidade de Rolante (RS), fez sua última contribuição nesta semana, pois a doação é permitida até os 70 anos. Foi a primeira vez que Valdomiro doou em Parobé, e acabou também sendo a última.
Com o sentimento de dever cumprido, o doador de O- afirma que aprendeu com o pai, Pedro José Pereira, já falecido, que possuía o mesmo tipo sanguíneo e fator Rh, a importância da ação nobre. O agricultor passou o aprendizado à diante. Todos os filhos dele, três homens e uma mulher, se tornaram doadores frequentes.
“O meu pai doava, e desde pequeno eu achava incrível a possibilidade de ajudar a salvar alguém através do meu sangue. Quando eu completei 18 anos comecei e nunca mais parei. Doava com frequência e sempre que precisavam de mim, eu ia”, conta.
Ele recordou de algumas situações comuns de décadas atrás. As instituições não podiam contar com voluntários devido a epidemia de AIDS, e pessoas desesperadas para ajudar amigos e familiares compravam sangue dos doadores – menos de Valdomiro. “É de graça e de coração que faço. Já doei um punhado de vezes. Não me importo com o número de vezes que tiver que ir. Se eu estiver bem e puder doar, podem sempre contar comigo”, ressalta.
Ao final de 50 anos de voluntariado, ele elogia o atendimento que recebeu em Parobé. O agricultor explica que costumava ir ao Hemocentro, na capital, mas quando soube da possibilidade de doar no novo posto, bem mais perto de sua casa, a praticidade falou mais alto.
O agricultor recorda com carinho os ensinamentos que recebeu do pai sobre a importância da doação de sangue. Foto: Valdomiro José Pereira/ Arquivo Pessoal
Um final feliz
Vilmar Fernandes, hoje com 64 anos, garante que a doação de sangue foi primordial para a sobrevivência do filho Alessandro, há quatro décadas, e acredita que todos deveriam abraçar a causa. Ele se tornou doador de sangue regular logo após sua experiência com o filho mais velho e se sente orgulhoso da iniciativa do seu caçula, Lucas.
“Sou doador há quase quarenta anos. Sempre incentivei os meus filhos para que fizessem a doação. Me alegro em ver que essa boa iniciativa está passando de geração em geração e gerando frutos”, conclui. Alessandro Fernandes, hoje com 40 anos, vive bem. É casado, tem um filho e é grato pela boa ação que salvou a sua vida.
Família Fernandes, unidos pela boa causa. Alessandro, hoje adulto, de bermuda azul abraçado no pai de camiseta vermelha. Foto: Vilmar Fernandes/ Arquivo PessoalA doação de sangue acompanha Vilmar há quase quatro décadas. Foto: Vilmar Fernandes / Arquivo Pessoal
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