CRÍTICA: “Aftersun” revela a delicadeza e melancolia da relação entre pai e filha

A história é contada a partir das memórias da filha e gravações de viagem. (Divulgação/A24)

Longa de estreia de Charlotte Wells como diretora explora a fragilidade das relações humanas

Será que estamos preparados para conhecer o lado mais vulnerável de quem amamos? É impossível pensar em outra coisa ao assistir Aftersun, longa da aclamada produtora A24, que marca a estreia da diretora escocesa Charlotte Wells nos cinemas. Estrelado por Paul Mescal (Calum) e Frankie Corio (Sophie), o drama é um mergulho na relação amorosa e sensível entre pai e filha, que partem para uma viagem à Turquia para comemorar o aniversário de 11 anos da menina.

Boa parte dos 101 minutos do filme são preenchidos por diálogos entre os dois personagens e não é possível saber detalhes da vida de ambos. A aventura de Calum e Sophie é apresentada ao telespectador por meio de gravações de uma câmera digital, intercaladas com cenas que remetem à memória da menina.

A beleza das paisagens, somada com a leveza dos momentos de conexão e carinho entre os protagonistas, pode até dar a impressão de que esse é um filme puramente sobre as relações de paternidade, se não fosse pela complexidade do personagem de Mescal, que trava uma batalha consigo mesmo em torno da depressão. São pelas memórias da jovem que pequenos detalhes mostram que, apesar da dedicação em ser um bom pai, Calum esconde um lado sombrio.

Mas nada é explícito, o que mexe ainda mais com os sentimentos do telespectador. É apenas na fragilidade de cenas, como o diálogo de Calum com o preparador de mergulho, que é possível imaginar a sua angústia. “Eu não me vejo aos 40, para ser honesto, já me surpreende ter chegado aos 30”. Seja pelo enquadramento da cena ou pelo talento de Paul Mescal exposto na tela, não sobram dúvidas do sofrimento vivido pelo personagem.

Em contrapartida, a pequena Sophie também enfrenta seus próprios dramas. Na porta da puberdade, ela lida com a fase delicada onde não se é nem criança o suficiente para portar-se como tal, nem adolescente o bastante para experienciar o que vê com curiosidade nos outros personagens durante a viagem.

O passado e fragmentos do presente se misturam, de forma não linear, do meio para o final do filme, quando acompanhamos a busca de Sophie, agora vivendo sua fase adulta (interpretada por Celia Rowlson-Hall), pelo pai, que por algum motivo não está mais presente na vida da filha.

Esse é definitivamente um filme sobre ausências, mesmo diante do encontro físico dos personagens, capaz de transportar quem está assistindo para aquele universo, como se pudéssemos vivenciar os sentimentos capturados ali. Mais do que isso, é uma experiência praticamente imersiva que consegue divertir e emocionar, de forma genuinamente verdadeira, mesmo diante de uma provável tragédia iminente.

Eduarda Ferreira

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