Conforme dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), são 3.585 alunos que possuem algum tipo de deficiência, e apenas 164 monitores

Por Bárbara Andrade e Larissa Schneider*

Criado em 2018, o projeto social Angelina Luz nasce junto com o diagnóstico de autismo de Angelina, filha de Erika Rocha, 44 anos (foto acima). Desamparada e sozinha, Erika se viu obrigada a estudar sobre o espectro autista para lutar pelos direitos da sua filha. Um deles diz respeito à presença de um monitor especializado em sala de aula. Mesmo com necessidade comprovada e pedido em laudo pela neurologista e terapeutas que acompanham a menina de 7 anos não conta com este apoio para acompanhar as aulas no 1º ano do ensino fundamental.

Este não é um caso isolado. Na rede estadual de ensino de Porto Alegre, o número de monitores para atender alunos com algum tipo de deficiência é de um monitor para cada 22 estudantes nessa situação, conforme dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), em outubro de 2023: são 3.585 alunos matriculados na rede estadual de ensino de Porto Alegre que possuem algum tipo de deficiência, enquanto há apenas 164 monitores em toda a rede para atendê-los. 


O cenário contraria a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que, em seu artigo 27, determina: “A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível”. Para que essa legislação seja cumprida, o papel do monitor escolar é fundamental, pois ele garante a promoção dos talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais do aluno. 

“O monitor é alguém realmente decisivo porque ele é um mediador. Sempre falamos em inserção, inclusão, e eu acrescentaria o termo pertencimento, porque o monitor também se faz necessário para ajudar nesse sentimento de pertencimento desse estudante no grupo”, destaca a psicóloga clínica e educacional, Maria Fernanda Hennemann.

“Estamos frustrados”, relata mãe que aguarda monitor educacional

A falta de profissionais para atender os alunos reflete no dia a dia de mulheres como a Taynara do Canto, mãe do Joaquim Foti, de 7 anos, que tem Transtorno do Espectro Autista (TEA) nível 2 e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). “Joaquim é uma criança não verbal e está ficando na escola somente uma hora por dia porque não tem monitor para ficar o restante do turno’’, relata Taynara, que teve de deixar seu trabalho para se dedicar ao cuidado com o filho. Em julho, ela ajuizou uma ação na Defensoria Pública com a solicitação de um monitor permanente para seu filho, mas até hoje nada mudou. ”Sinceramente, estamos frustrados e desacreditados. Não vejo escolas preparadas e nem pessoas preparadas para realizar esse auxílio”, observa.

Ao perceber que muitas mães passam por essa dificuldade, Erika desenvolveu o projeto Angelina Luz, que tem como objetivo auxiliar mães atípicas em vulnerabilidade social. Atualmente, o projeto atende mais de 600 famílias. “A principal apreensão das famílias atípicas é que, sem um monitor capacitado, nossos filhos têm os direitos constitucionais desrespeitados, já que a presença do monitor se restringe a dias e horários específicos e reduzidos”, conta a mãe de Angelina.

A Lei nº 15.322, de 25 de setembro de 2019, que institui a Política de Atendimento Integrado à Pessoa com Transtornos do Espectro Autista no Estado do Rio Grande do Sul, determina que o profissional de apoio escolar deve ser uma pessoa devidamente capacitada na interação e no manejo comportamental de alunos com TEA. 

“Os alunos precisam de monitores especializados, e não estudantes de ensino médio que não possuem experiência. Muito se fala a respeito da educação inclusiva, mas nada se faz”, diz. “Não somos as mães loucas ou histéricas. Somos as mães históricas, pois somos a resistência. Jamais iremos desistir da luta, pois desistir da luta é desistir dos nossos filhos, e isso jamais iremos fazer”, completa. 

Promessa de mais contratações

Questionada sobre o baixo número de monitores em Porto Alegre, a Secretaria Estadual da Educação disse, em nota, que “após a sanção do Governo do Estado, que autorizou a contratação emergencial de mais 9 mil profissionais da área da Educação, a Seduc reitera que todas as vagas solicitadas serão plenamente preenchidas conforme a demanda”. Trata-se do PL 364/2023, aprovado pela Assembleia Legislativa no dia 22 de agosto. Dos 9 mil profissionais autorizados, até 5 mil poderão ser professores temporários para atuar na regência de classe ou na educação especial e no atendimento educacional especializado (AEE).

A psicóloga Maria Fernanda reflete sobre o cenário da inclusão escolar na capital gaúcha: “Temos que aprender muito ainda, a inclusão é um desafio complexo, além de ser um cenário em desenvolvimento. Em Porto Alegre eu vejo muitas potencialidades, mas também muita fragilidade, o capacitismo é um exemplo disso’’. 

As escolas regulares com maior número de alunos com deficiência são o Colégio Estadual Cônego Paulo de Nadal, localizado no bairro Cavalhada, com dois monitores para atender 40 alunos com deficiência, e a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dr. Pacheco Prates, localizado no bairro Belém Velho, com apenas um monitor para atender 40 alunos com deficiência. Na tabela a seguir, é possível conferir a situação de cada escola da rede estadual de Porto Alegre, conforme resposta obtida pela reportagem via LAI, em outubro de 2023.

*Reportagem produzida na atividade acadêmica de Jornalismo de Dados e Checagem (supervisão: Taís Seibt)