Em 95% dos municípios do Vale do Caí, cada legenda poderá colocar no máximo 10 candidatos no pleito municipal

Dos 497 municípios gaúchos, 380 possuem até 15 mil habitantes, o que representa mais de 76% do total. (Foto: Henrique Kirch/Beta Redação)

Os partidos políticos já estão planejando diretrizes para as eleições municipais de 2024. Porém, desta vez, com mudanças nas regras eleitorais. Trata-se da alteração gerada pela lei 14.211/21 que reduz o teto máximo de candidatos ao Poder Legislativo.

Diferentemente de pleitos anteriores, onde cada sigla podia apresentar uma nominata condizente com o total de vagas nas Câmaras de vereadores mais a metade (150%), agora terá como teto a inscrição total de cadeiras mais um (100% mais um). Em Montenegro, por exemplo, onde a Câmara é composta por 10 vereadores, cada legenda poderá apresentar, no máximo 11 candidatos, e não mais 15 como foi até 2020.

A legislação já se fez presente nas eleições federais de 2022. Entretanto, o pleito municipal ganha mais notoriedade em virtude da proximidade entre o eleitor e o candidato. A redução do número máximo de candidaturas ao legislativo exige uma seleção mais criteriosa dos postulantes, diminuindo a chance de nomes laranjas e, até mesmo, constrangimentos políticos.

Por outro lado, aumenta a possibilidade de migração de lideranças de grandes partidos, rejeitados da disputa pela régua de corte, para legendas menores, bem como inibe o surgimento de novas lideranças.

O Vale do Caí, por exemplo, é composto por 19 municípios. Em 18 deles, a Câmara de Vereadores é formada por nove legisladores. Somente em Montenegro, há 10 cadeiras no Legislativo. Uma vez que a quantidade de vereadores está relacionada com o número de habitantes, estipulada pela Lei Orgânica, dentro dos limites da Constituição.

A região do Vale do Caí é composta por 172 vereadores. (Foto: Divulgação/Vale do Caí)

O que falam as lideranças políticas

Diante da mudança, a Beta Redação conversou com lideranças políticas sobre a mudança na legislação eleitoral para elencar os prós e contras. 

O presidente do MDB de Tupandi Matheus Klassmann, 26 anos, é favorável à mudança na legislação. “Acredito que os eleitores só têm a ganhar com essa decisão, uma vez que é grande a probabilidade de que com um número menor de candidatos em relação a eleições anteriores, os candidatos escolhidos sejam pessoas com maior capacidade e que de fato estejam dispostas a concorrer. Uma vez que em muitos pleitos se observava candidatos somente para fechar o número de quociente, por exemplo”, afirmou o também vereador.

Matheus Klassmann foi o vereador mais votado de Tupandi, com 264 votos (6,94%). (Vídeo: Arquivo pessoal/Matheus Klassmann)

A prefeita de Maratá Gisele Schneider (Republicanos), cidade com 2.470 habitantes (IBGE 2022), também aprova a nova regra eleitoral. “Em municípios pequenos não é fácil conseguir compor toda a nomenclatura com a quantidade total de candidatos possíveis. Todavia, com esta restrição, em cidades maiores, será necessário realizar uma seleção dos melhores candidatos, o que também é bom para o eleitor” relata.

Gisele Schneider foi eleita a primeira mulher prefeita da história de Maratá com mil fotos. (Foto: Divulgação/Jornal Ibiá)

Já o vereador de Harmonia Mateus Specht (PTB), 22 anos, é contrário à redução do teto de candidatos. “Trato a candidatura como uma porta para a vida política. Reduzindo a quantidade e, com isso, as opções a quem votar, será inviável termos novas lideranças em nossa região, principalmente pelo fato de provavelmente haver uma pré-seleção interna em cada partido. A política deve ser aberta a todos, homens e mulheres. Vozes e opiniões devem ser ouvidas em maior quantidade possível. A alteração gerada pela lei 14.211/21, em minha opinião, é um retrocesso no processo democrático brasileiro”, explica o parlamentar.

Mateus Specht, eleito aos 19 anos, é o vereador mais jovem da história de Harmonia. (Foto: Arquivo pessoal/Mateus Specht)

O secretário do diretório do PT de Salvador do Sul Joaquim Lunckes também reprova a nova reforma eleitoral. “Ao meu entender, há mais malefícios que benefícios, uma vez que se está impedindo um direito ao cidadão: ser votado. Muitas vezes, os partidos ficam nas mãos de poucos ou determinados grupos que, por alguma razão, poderão se valer dessa redução (limitação) do número de candidatos. Dessa forma, impedindo o cidadão de concorrer, quando não há mais tempo hábil para trocar de partido,” analisa o político.

Joaquim Lunckes diz que já foi vítima do teto de candidatos e não foi permitido concorrer, contrário ao seu desejo. (Foto: Divulgação/Jornal Expressão Regional)

Para o prefeito de Barão Jefferson Schuster Born, a mudança é desfavorável tanto para o partido como ao eleitor. “Anteriormente à reforma, poderíamos colocar 14 candidatos pelo Partido Progressista no nosso município. Inclusive, nomes de relevância. Entretanto, agora somos obrigados a apontar somente 10 candidatos. O que limita uma pluralidade de bandeiras políticas”, expôs o gestor.

Jefferson Schuster Born assumiu a presidência da Associação dos Municípios do Vale do Rio Caí (Amvarc) no início de 2023. (Vídeo: Arquivo pessoal/Gabinete do Prefeito de Barão)

A visão dos especialistas

A reportagem entrevistou também especialistas do meio político. Entre eles, Cleber Benvegnú, cientista político. Além disso, atua como jornalista e comentarista dos grupos Band e Jovem Pan do Rio Grande do Sul.

Cleber Benvegnú foi secretário de Comunicação e secretário-chefe da Casa Civil do governo Sartori. (Foto: Arquivo pessoal/Luiz Otávio Prestes)

Para Benvegnú, a mudança da lei é extremamente relativa. “Toda lei depende de uma aplicação ética e moral no mundo dos fatos. E, nesse caso, não será diferente. Ou seja: só um texto de lei não resolverá a eventual baixa qualidade de candidaturas à vereança.

Isso dependerá de uma consciência dos próprios partidos, que são quem têm a responsabilidade de selecionar nomes com vocação para a política, com compreensão do bem comum e com capacidade de entregar bons serviços à comunidade”, afirma.

Questionado sobre a questão tratada em relação ao eleitor, o cientista político analisa que dependerá da sua aplicação. “A diminuição do número de vagas tenderá exigir mais qualidade na escolha dos candidatos a vereador – e isso é um benefício ao eleitor.

Todavia, se essa diminuição servir à exclusão da participação popular nos partidos e ao coronelismo nas decisões de cúpula partidária – aí estaremos diante de um malefício ao eleitor e à democracia. Penso que a lei tem um bom propósito, mas precisaremos acompanhar sua aplicação durante as eleições de 2024″, conclui.

O publicitário e coordenador de campanhas políticas Rafael Zorn Ramos é favorável à mudança na legislação, uma vez que seu âmbito profissional valoriza estratégias de marketing. “Pelo viés publicitário, o marketing político precisa ser mais assertivo e estratégico, Uma vez que com menos candidatos, há mais visibilidade para os que estão no pleito. Dessa forma, a melhor campanha/estratégia, seja ela nas ruas ou no digital, atingirá seu objetivo. Obviamente, dependendendo de cada cenário e município”, analisa.

O publicitário foi coordenador da campanha do deputado estadual Luciano Silveira (MDB), eleito com 36.770 votos em 2022. (Foto: Arquivo pessoal/Rafael Zorn Ramos)

Já no quesito candidato-eleitor, o marketeiro reprova a nova regra eleitoral. “A política é representatividade. Nessa mudança, tira-se força de novos nomes que talvez queiram seguir alguma ideologia diferente das grandes siglas. Ou seja, mesmo que sem expressão, enaltece a oportunidade de renovar e trazer o debate genuíno das demandas da comunidade para a Câmara de Vereadores”, finaliza.

As datas das Eleições Municipais 2024 ainda foram oficialmente definidas pela Justiça Eleitoral. Entretanto, espera-se que o primeiro turno aconteça no primeiro domingo de outubro (dia 06) e o segundo, no último domingo do mês (dia 27). Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), estarão disponíveis, em todo o país, 58.208 vagas para vereadores e 5.567 para prefeitos.