Quinto deputado mais votado para a Assembleia Legislativa, o vereador de Porto Alegre integrará uma bancada negra, que pretende liderar a luta antirracista no Parlamento

Matheus Pereira Gomes é vereador de Porto Alegre, eleito pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), em 2020. Nas eleições de 2022, aos 31 anos, foi o deputado estadual mais votado de Porto Alegre e o quinto mais votado do Rio Grande do Sul, totalizando mais de 82 mil votos.

Ativista do movimento negro, Matheus integrou a primeira turma de alunos cotistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) — instituição pela qual alcançou a titulação de mestre em História.

Desde a adolescência, Matheus tem envolvimento com a militância política progressista, por melhores condições na educação e outras pautas sociais.

Em entrevista exclusiva à Beta Redação, Matheus Gomes (PSOL) falou sobre sua história, as conquistas e desafios do mandato atual, expectativas para a atuação como deputado estadual e muito mais.

Confira a íntegra da conversa, feita por Whatsapp com o parlamentar.

Beta Redação: Fale um pouco sobre sua adolescência e sobre quando surgiu o desejo de entrar para a política.

Matheus Gomes (PSOL): Estudei a minha vida inteira em escola pública e isso sempre nos trazia temas políticos oriundos da dificuldade que a educação enfrenta no Brasil: falta de professor, greves justas por aumentos de salário, a questão da infraestrutura. Foi em uma dessas mobilizações que comecei a minha militância, como membro do movimento estudantil em defesa da educação, ainda adolescente.

Já tinha contato com a política dentro de casa, porque meus pais eram militantes, mas, nesse momento, eles não estavam muito ativos. Então, o marco do meu envolvimento foi no Ensino Médio, na luta pela defesa da educação pública.

Na verdade, falo de entrar na política porque a política, para mim, nunca teve sentido apenas eleitoral; sempre um vínculo por melhores condições de vida e direitos sociais, mais igualdade, que sempre fiz através dos movimentos sociais.

Beta Redação: Quais foram as dificuldades que enfrentou durante como seu mandato como vereador?

Matheus Gomes (PSOL): Certamente, as maiores dificuldades do momento político que a gente vive têm a ver com a ascensão de um movimento neofascista, extremamente autoritário, com uma visão de restrição total de direitos sociais e trabalhistas, antiecológico, que é o Bolsonarismo.

Ele penetrou em todas as esferas da política e, aqui em Porto Alegre, não é diferente. Enfrentamos uma prefeitura alinhada ao Bolsonarismo e uma bancada de vereadores que também tem essas ideias. Isso é o que constituiu a grande dificuldade da nossa legislatura até o momento.

A Câmara retirou muitos direitos dos trabalhadores. Um exemplo disso foi o passe livre no dia das eleições, que veio a público e gerou uma grande revolta. Conseguimos recuperar, mas é uma demonstração de como a Câmara atuou nos últimos dois anos para restringir os direitos sociais, e não ampliar a igualdade e a democracia na nossa cidade.

E, nesse sentido, nós enfrentamos uma onda de violência política. Fomos infelizmente ameaçados de morte, nossa integridade física por várias vezes ao longo desses 22 meses [foi ameaçada]. Isso também se vincula ao crescimento do Bolsonarismo, que é uma coisa que prega o ódio e a intolerância. Então, essas foram as dificuldades que a gente teve no último período.

Beta Redação: Nestas eleições, tivemos um grande número de candidatos(as) negros(as) eleitos(as) pela população. Como enxerga esse crescimento?

Matheus Gomes (PSOL): O crescimento das candidaturas negras, com certeza, foi o fenômeno mais progressista e importante da política brasileira em uma perspectiva de democratização desse espaço e desconexão com uma demanda histórica de um país, que teve sua origem na escravização de homens e mulheres negros, mas que nunca os incluiu de maneira igualitária em todos os âmbitos da sociedade.

Nos últimos anos, conseguimos mudar a percepção do povo brasileiro sobre a questão racial. Isso foi uma obra do movimento social negro, com medidas como as ações afirmativas. As universidades mostraram que o racismo é um problema real no Brasil.

Agora, a mudança dessa consciência se expressa também na política com a participação de negros e a eleição de parlamentares que são comprometidos com as bandeiras históricas do movimento social negro brasileiro.

Em 2023, uma nova jornada como deputado estadual. (Foto: Facebook)

Beta Redação: Qual a sensação de ver nas apurações que havia sido eleito como deputado estadual?

Matheus Gomes (PSOL): A gente ficou muito feliz, com a sensação de que o trabalho feito em Porto Alegre foi referendado pela população, já que fomos a candidatura mais votada na capital gaúcha. E, mais do que isso, [a candidatura] expandiu ao conjunto do nosso Estado, então é algo que nos dá força para erguer as bandeiras que a gente defende, das lutas antirracista, ecológica, por mais direitos sociais e democracia.

Vamos começar nosso mandato estadual com a força e autoridade de ser uma das candidaturas mais votadas no Rio Grande do Sul, mesmo em um contexto tão difícil que a gente enfrenta.

Beta Redação: Uma nova etapa se inicia em 2023. Quais os objetivos nessa jornada, como deputado estadual?

Matheus Gomes (PSOL): Nós temos o compromisso de construir uma nova tradição política, através da Bancada Negra — a primeira da história da Assembleia Legislativa gaúcha. A partir disso, deixar um legado de formulação de políticas públicas antirracistas, de ampliação dos direitos básicos da população nesse momento, com a prioridade do combate à fome, com o retorno do investimento público em direitos sociais, como educação, habitação, saúde e defesa do meio ambiente, que é uma pauta esquecida no Rio Grande do Sul e a gente quer erguer com força durante os quatro anos do nosso mandato.

Beta Redação: Até aonde o político Matheus pretende chegar? E o que o cidadão Matheus quer para o futuro do Rio Grande do Sul e do Brasil?

Matheus Gomes (PSOL): Olha, o político Matheus Gomes não caminha sozinho. Tenho uma trajetória sempre vinculada aos movimentos sociais, à organização partidária, e a gente almeja dar um futuro melhor para o nosso país, construir uma sociedade mais igualitária, que preserve o meio ambiente, que garanta direitos iguais para a população trabalhadora, para as mulheres, os indígenas, comunidade LGBTQIA+.

Então, nós sonhamos alto e esperamos que o movimento que estamos instigando hoje tenha um impacto social para as próximas gerações, que ergam essa bandeira junto com a gente para que um país tão rico e forte como o Brasil possa ocupar esse lugar na América Latina e no mundo, e dar uma vida digna para o conjunto da sua população.

E isso nós vamos fazer combatendo a concentração de poder e de riqueza. Nossa luta é de longo prazo e não se encerra única e exclusivamente na ação parlamentar, na nossa existência enquanto deputado estadual. Ela está conectada a uma demanda social coletiva na resolução desse problema em que a gente quer chegar.