Prática de eSports exige cuidados semelhantes às outras modalidades esportivas

Os esportes virtuais atraem cada vez mais praticantes nos últimos dez anos, muitos deles, interessados em se profissionalizar na modalidade. De acordo com a Pesquisa Game Brasil de 2023, 38,8% dos praticantes de eSports jogam todos os dias. Os smartphones e computadores são os principais dispositivos escolhidos para o jogo online. Contudo, não basta ser bom de gameplay: é necessário levar em consideração a saúde física e mental dos participantes. 

Responsável pela coordenação do Laboratório de Performance e Saúde da equipe profissional de eSports Team Liquid, o psicólogo Claudio Godoi destaca que sua equipe presta apoio multidisciplinar aos seus jogadores. “Na minha equipe, a gente tem fisioterapeuta e diversos acompanhamentos, voltado aos aspectos de saúde e performance, que é diferente de um acompanhamento clínico de consultório”, disse. 

Claudio Godoi, psicólogo da Team Liquid, em ação. (Foto: Cesar Galeão/Garena)

Godoi atende entre 20 e 25 competidores do Brasil e do exterior. O profissional detalha o trabalho realizado com os pro players. “Não é uma questão de queixa, mas a própria questão de ansiedade competitiva que a gente colocaria nesse aspecto. Às vezes, o jogador não consegue dormir antes de uma competição importante, e conseguir controlar esse grau de nervosismo muitas vezes é um componente. É um dia importante que pode decidir uma carreira, pode decidir o futuro dele, então, é bem comum ter alguns processos, e a gente trabalhar muito para que esse, ele ou ela consiga ter uma boa semana para a competição”, ressalta o coordenador. 

Atendendo em uma clínica no bairro Moinhos de Vento, em Porto Alegre, a fisioterapeuta Eduarda Costa relata as queixas mais frequentes trazidas por quem pratica eSports. “Quem joga online geralmente aparece aqui na clínica com lesões envolvendo as mãos, a coluna e, principalmente, as lesões por esforço repetitivo (LER). São os mesmos problemas encontrados por quem trabalha por muitas horas a fio em um escritório, no computador”, disse a profissional. As LER, que, no Brasil e em outros países, são consideradas doenças ocupacionais, incluem inflamações, tendinites, síndrome do túnel do carpo e dores musculares. 

Especialista em Ortopedia e Traumatologia pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, o médico Rafael de Lucena relata que a demanda de pacientes em seu consultório ortopédico aumentou. “Com a pandemia, em que o pessoal ficou em regime de home office, se tornou muito comum receber pacientes com esse tipo de lesão por uso de aparelhos eletrônicos”, conta. Lucena afirma que a faixa etária dos pacientes é, na maioria, de 15 a 35 anos, frequentemente jovens acompanhados pelos pais. 

O ortopedista ressalta a importância dos cuidados necessários ao longo dos períodos jogando. “Uma boa prática é se atentar para melhorar a posição em que fica sentado na cadeira, procurando uma posição mais ergométrica, confortável e a uma distância adequada do monitor. Não é raro que as dores se devam a jogar em sofás baixos ou deitados em camas”, disse. O ortopedista, também, destacou a importância da realização de pausas para a alimentação e repouso adequados, alongamento e fortalecimento físico das mãos, braços e coluna.

O profissional de jogos Samuel Vidal, conhecido como SkS, relata em live na plataforma de streaming Twitch que nunca sofreu lesões relacionadas ao tempo excessivo de computador. “Nesses meus 9 anos de Counter-Strike GO, mais os meus outros de 1.6 (uma versão anterior do jogo), e tudo o mais, os meus 13 anos de CS e as 13 mil horas de jogo, nunca tive lesão. Eu sempre procurei manter a postura, eu tenho uma boa postura. Quanto às lesões, eu não tenho, nunca tive lesões envolvendo isso”, disse. 

SkS em partida de CS:GO, com a participação dos jogadores profissionais Zigueira e oNe. (Vídeo: Sksfps1/Divulgação)

Durante a conversa, SkS afirma fazer academia regularmente e não ter vícios, favorecendo sua saúde. “Não bebo, não fumo, não faço nada não. Sou o legítimo nerd”, comenta. Porém, diz não ter condições de fazer acompanhamento psicológico para lidar com a rotina intensa, que inclui até 16h seguidas de jogos em live, edição dos vídeos, academia e outras atividades. 

Glossário

  • Counter-Strike (CS): franquia de jogos virtuais de tiro em primeira pessoa. CS 1.6, CS2 e CS:GO são diferentes versões do game. 
  • Gameplay: rodada de jogos. Também pode ser usado para falar sobre uma jogada específica. 
  • Live: transmissão ao vivo através de plataformas digitais. 
  • Plataforma de streaming: ambiente virtual no qual são realizadas transmissões em tempo real. 
  • Pro player: jogador online profissional.