Da proteção à gestão: a trajetória de uma assistente social movida pelo amor à juventude

Beta Redação foi até a Lomba do Pinheiro para saber mais sobre a atuação da assistente social e coordenadora pedagógica do CPCA, Paula de Fátima Moura dos Santos

Em uma segunda-feira nublada, eu e meu colega Denílson partimos até o Centro de Promoção da Criança e do Adolescente São Francisco de Assis, o CPCA, na Lomba do Pinheiro, zona leste de Porto Alegre. No local, encontramos diversas crianças no pátio. Quando chegamos, Paula, assistente social e coordenadora pedagógica do CPCA, estava em uma reunião, mas logo nos atendeu em sua sala. No dia 15/05, quatro dias antes da nossa visita, havia sido comemorado o Dia do Assistente Social, o que serviu como incentivo para a reportagem da Beta Redação saber mais sobre essa profissão.

Paula, que é natural de Santa Maria (RS), hoje ocupa a gerência dos programas, projetos e serviços do CPCA. Ela percorreu uma longa e diversa trajetória até chegar ao cargo que atualmente ocupa. Uma caminhada marcada por experiências transformadoras e pela convicção de que a promoção de direitos é um compromisso que exige ação imediata.

A Coordenadora Pedagógica recebe a reportagem em sua sala, na sede do CPCA – DENILSON FLORES/BETA REDAÇÃO

Mulher negra e também alvo de diversas formas de opressão, ela se vê em uma posição protegida pelo acesso ao trabalho formal e a uma vida com mais estabilidade. “Isso me permite querer que outros também tenham essa possibilidade. Meu ponto de partida é o bem-estar e a segurança das pessoas”, afirma.

Aos 21 anos, ela se tornou conselheira tutelar em sua cidade natal, depois de iniciar a graduação em Psicologia e abandonar o curso ao sentir-se perdida. Durante esse período de transição, aceitou uma vaga de estágio na Prefeitura local e se matriculou em um curso de Pedagogia à distância apenas para viabilizar o estágio. A experiência no Conselho Tutelar, no entanto, foi um divisor de águas. “Foi nessa vivência que eu tive contato com a rede, conheci os serviços e percebi: acho que posso ser assistente social”, conta.

Muito expressiva, a Assistente Social relembra sua trajetória até assumir a Coordenação Pedagógica do CPCA – DENILSON FLORES/BETA REDAÇÃO

Experiência ampliada na proteção social

A certeza se consolidou com o início da graduação em Serviço Social, que cursou enquanto ainda estava no Conselho. Com a unificação das eleições dos conselhos tutelares em todo o país, seu mandato acabou sendo prorrogado, o que fez com que ela permanecesse sete anos na função. Ao longo desse tempo, sua atuação se aprofundou no enfrentamento às violações de direitos e na escuta direta de crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade.

Após a graduação, passou por uma residência multiprofissional em saúde no Hospital São Lucas da PUC, em Porto Alegre, entre 2015 e 2017. A mudança para a capital trouxe um novo olhar: a realidade hospitalar, com atendimentos mais objetivos e dinâmicas fechadas, contrastava com o trabalho em rede que havia vivenciado. Apesar disso, o foco na infância e adolescência permaneceu.

Em seguida, Paula foi selecionada para trabalhar no Centro da Juventude da Restinga, um dos seis polos do Programa de Oportunidades e Direitos do Estado. Atuando desde a implementação do centro, a assistente social teve contato direto com jovens carregados de energia, sonhos e expectativas. Pouco depois, passou a atuar no CPCA, na Lomba do Pinheiro, primeiro como técnica e, posteriormente, na coordenação do Centro da Juventude local.

Paula trabalhando dentro de sua sala no CPCA – DENILSON FLORES/BETA REDAÇÃO

Entre idas e vindas, trabalhou também no Hospital Conceição e no SAF (Serviço de Atendimento às Famílias), ambos ligados ao CPCA. Depois de sua licença-maternidade, retornou à coordenação do Centro da Juventude. Quando o então diretor pedagógico da instituição foi chamado para um novo desafio fora do estado, ela assumiu, em setembro de 2024, a gerência dos serviços da organização.

Hoje, coordena uma complexa rede de projetos e programas sociais que atendem majoritariamente o território da Lomba do Pinheiro. O CPCA, instituição com mais de 45 anos de atuação, desenvolve políticas públicas de assistência social, educação e juventude em parceria com o poder público. Paula gesticula bastante com as mãos enquanto explica o seu papel no CPCA: “Meu papel é orquestrar todos os serviços da instituição. Embora cada um tenha sua coordenação, cabe a mim acompanhar as metas, planos de trabalho, contratações, avaliações e pensar os processos pedagógicos”, explica.

A rotina é intensa: começa às 8h com reuniões com os freis franciscanos, diretores da instituição, e segue com articulações internas e externas, como encontros com equipes dos serviços e com representantes de secretarias municipais e estaduais. Também participa ativamente da mediação de conflitos e de ajustes nos processos de trabalho.

Em momento sem chuva, Paula apresenta o espaço. Enquanto responde aos alunos que apresentavam curiosidade – DENILSON FLORES/BETA REDAÇÃO

A motivação, segundo ela, segue firme: a defesa da infância e da juventude. “Meu ponto de partida sempre foi a promoção de direitos. E, quando trabalhei no Conselho Tutelar, acessei territórios e situações de violações profundas. Isso me mobilizou profundamente”, lembra.

Apesar das dificuldades estruturais enfrentadas pelo território onde atua — marcado pela violência, precarização de serviços públicos, falta de saneamento, transporte e escolas —, ela acredita no potencial da juventude. “A energia, o sonho e o desejo que os jovens carregam me mobilizam. É nessa perspectiva que penso meu trabalho.”

O olhar da gestora é atravessado por camadas de análise social, política e cultural. Para a assistente social, nenhum serviço faz sentido se ela não compreender de onde vêm as pessoas que atende. “As políticas têm seus recortes, mas elas não funcionam se não forem pensadas a partir do território e da realidade concreta das famílias que chegam até nós.”

Prestes a completar 40 anos, Paula segue movida pela convicção de que os direitos das crianças, adolescentes e jovens não são promessas para o futuro. “As coisas estão acontecendo agora. O acesso à saúde, ao estudo, ao trabalho precisa ser garantido hoje — e é isso que me move.”

CPCA – Estrada João de Oliveira Remião, 4444 – Lomba do Pinheiro, Porto Alegre – RS – DENILSON FLORES/BETA REDAÇÃO

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