Ana Paula Machado: “O desafio é fazer a população entender o papel de um vereador”

Ana Paula Machado se inspirou em outra mulher para basear seu comportamente na Câmara de Vereadores. Foto: Arquivo pessoal/Ana Paula Machado

Única mulher na Câmara de Montenegro, a representante do Podemos foca em ações para o empreendedorismo feminino

Em 150 anos de história, Montenegro, cidade da região metropolitana de Porto Alegre (RS), teve apenas oito mulheres ocupando assentos na Câmara Municipal de Vereadores, segundo consta nos registros do Legislativo. Atualmente, somente uma das dez vagas da Câmara é preenchida por uma figura feminina, a da vereadora Ana Paula Machado, do partido Podemos.

“A representatividade feminina na política é muito baixa”, avalia a política de 41 anos. Na visão dela, as filiações partidárias já são indicadores do déficit feminino na área. “Atualmente, os partidos podem ter 11 candidatos concorrendo para vereador, e desses, quatro podem ser mulheres. Mas muitas siglas encontram dificuldade para preencher até esse número baixo”, comenta Ana Paula.

Casada, mãe de dois filhos e com cargo de servidora pública — o qual exerce no setor de marcações de exames da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Montenegro — Ana acredita que a sobrecarga das atividades femininas pode estar associada ao baixo interesse das mulheres pela política.

“Eu as entendo, sei que é difícil. A mulheres têm muito mais tarefas do que os homens. Muitas vezes, tenho que abrir mão de estar com meu marido e meus filhos, pois a gente tem inúmeros compromissos que precisam ser cumpridos. Às vezes chego a pensar até que ponto vale a pena deixar a família de lado, e não acompanhar de perto o crescimento dos meus filhos”, desabafa a vereadora.

Contudo, Ana persiste e inspira outras mulheres a seguirem esse caminho – assim como ela também foi inspirada por outra presença feminina, a da ex-vereadora Rose Almeida (PSB), que teve mandatos entre 2005 e 2020.

Embora o vínculo com a política tenha sido estabelecido e instigado pelo ex-vereador Carlos Einar de Mello (PP), o Naná, a quem Ana assessorou durante nove anos, era em Rose que ela mirava na hora de buscar exemplo de posicionamento feminino na Casa Legislativa. “Admirava a postura dela, a forma de se comunicar e de tratar as pessoas, e me via naquele lugar fazendo o que ela fazia”, conta.

Enquanto assessora, ela se formou em Recursos Humanos, fez pós-graduação em Projetos e foi admitida em concurso público no município. Segundo sua própria avaliação, essa bagagem faz diferença no trabalho que hoje desenvolve na cidade.

Em suas propostas de campanha, Ana Paula prometeu se dedicar a cinco áreas: a causa animal, a saúde, a educação, o empreendedorismo feminino e a infraestrutura rural e urbana. “O desafio, muitas vezes, é fazer a população entender que o papel de um vereador não é estar tirando foto de buraco. Fui para um lado diferente, foquei em ações. Mas isso não quer dizer que deixo de cobrar o Executivo a cada dúvida que tiver sobre algum projeto”, afirma.

Confira a entrevista para a Beta Redação.

Uma das ações consolidadas da vereadora Ana Paula Machado é a realização da Semana do Empreendedorismo Feminino, que promove desfiles e feiras na cidade. Foto: Arquivo pessoal/Ana Paula Machado
Qual o principal motivo que levou a senhora a ingressar na política?

Fui convidada pelo meu antigo chefe, o ex-vereador Naná. Trabalhei com ele durante nove anos e acabei gostando da política. Ele foi o incentivador e apoiador da minha campanha. Conversei com a minha família, eles ficaram em dúvida, mas decidi tentar, concorri, e deu certo.

Quais foram os principais aprendizados que obteve durante o período em que trabalhou como assessora parlamentar, e como isso moldou seu trabalho como vereadora?

Foi uma experiência muito importante que me ajuda em todo o trabalho como legisladora. Eu já tinha bastante conhecimento, sabia como funcionavam as coisas dentro da Casa Legislativa, conhecia o regimento interno e as regras de tanto acompanhar as sessões. Isso me trouxe uma facilidade para abordar as pessoas, como conversar com elas, e o que pode ou não pode ser feito na gestão pública.

Como avalia a representatividade feminina na Câmara de Vereadores de Montenegro?

A gente representa a mãe, a esposa, a dona de casa e tantas outras mulheres, e sabemos das dificuldades umas das outras: questões como vagas nas creches, violência doméstica, o empoderamento feminino, o empreendedorismo. Por isso, hoje a gente representa pouco, diante da quantidade de mulheres e necessidades que existem. Precisamos que nos ouçam, para que conheçam nossos anseios. Mas a representatividade é muito baixa, tínhamos que ter mais mulheres na política.

Quais medidas a senhora acredita serem necessárias para promover uma maior diversidade de gênero e equilibrar a representação na política local?

Vejo com muita tristeza que os partidos têm dificuldade de colocar mulheres para concorrer. Eles as procuram, mas elas não querem. Eu entendo, sei que é difícil. E hoje em dia, por causa das redes sociais, está muito mais difícil ser vereador. Estamos muito expostos e as pessoas criam situações sem fundamento, cada um fala o que quer, as pessoas estão ali criticando e é muito difícil de controlar. Para estar nesse meio tem que ter inteligência emocional e saúde mental muito boas.

Quais são as principais questões relacionadas à proteção animal nas quais tem focado durante o seu mandato?

Procurei ONGs e protetores de animais para saber o que eu poderia fazer pela causa animal. Eles disseram que o melhor caminho seria auxiliar nas castrações. Então, criei o projeto SOS Amigo Animal e um brechó para arrecadar fundos para as castrações. No início do projeto, veio a pandemia, então a gente teve que se adaptar. Fizemos lives com distribuição de brindes, parcerias com vários supermercados para serem pontos de coleta para arrecadação de roupas. Hoje, o projeto está consolidado, com pontos de coleta e brechós mensais.

No início do projeto eram feitas dez castrações por mês, e passamos para 100, devido às minhas emendas impositivas. Consegui parceria com a Penitenciária Modulada de Montenegro para fazer casinhas para cães, que foram distribuídas a várias ONGs. Mas há pessoas que me criticam muito por dar emenda para a causa animal.

Quais são os principais projetos ou iniciativas que a senhora tem liderado ou apoiado durante o seu mandato como vereadora, e como eles impactam a comunidade de Montenegro?

Uma das primeiras coisas que fiz foi criar a Semana do Empreendedorismo Feminino. Conseguimos nos aproximar dos grupos que existiam para fomentar o trabalho das mulheres dentro da cidade e colocamos o evento no calendário oficial do município, no mês de novembro. Ao longo dos anos, fizemos várias feiras.

Pela área da saúde, fiz o projeto Óleo para os olhos, pois as pessoas procuram muito a secretaria para pedir óculos de grau. A partir da ideia que vi em um fórum da causa animal, de uma vereadora de Sapucaia do Sul que recolhia óleo para reverter à causa, pensei em usar a mesma tática, mas voltada para os óculos. Hoje, uma empresa capacitada recolhe o óleo e repassa diretamente o dinheiro para a ótica, que criou uma conta específica para o recurso, que vamos acompanhando e liberando para compra de óculos. Em cerca de dois anos, mais de 20 óculos já foram distribuídos para pessoas de baixa renda.

Quando assumiu a cadeira no legislativo a senhora disse que reconhecia problemas no setor de marcação de exames do município e que essa seria uma de suas bandeiras. Quais eram essas carências e o que a senhora conseguiu fazer na tentativa de saná-las?

Tínhamos filas enormes de agendamentos de exames, e destinei uma das minhas primeiras emendas para isso, por que é o setor em que trabalho. Tínhamos filas para exames de ressonância e tomografias e uma série de outras especialidades, que são exames caros e que não são pagos pelo município. Encaminhei duas vezes emenda impositiva para consultas e exames especializados para desafogar a fila. Conseguimos colocar tudo em dia.

Pretende concorrer à reeleição neste ano?

Sim, porque quero continuar o que tenho feito. As pessoas podem não gostar de mim, por seja lá o motivo que for, mas ninguém vai poder dizer que não trabalhei. Não é fácil, mas a gente precisa das mulheres na política.

Clarice Almeida

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