Em Santo Antônio da Patrulha, o Entrevero FC é mais do que um time de futebol de salão; é um refúgio de mulheres de idades e profissões variadas que encontraram no esporte uma terapia coletiva, um escape da rotina e, acima disso, uma segunda família.
É no Ginásio Municipal Caetano Tedesco, em Santo Antônio da Patrulha, excepcionalmente na quarta-feira nesta ocasião, que o time se encontra. O relógio marca 21h e a cena no entorno da quadra é comum para esta equipe: enquanto as jogadoras do Entrevero FC chegam e se preparam para o jogo, crianças e jovens de diversas idades ocupam parte das arquibancadas e da borda da quadra, brincando e assistindo às mães e responsáveis. Inicialmente tímidas com a presença da reportagem, as atletas logo se soltam, posam para as fotos e se entregam ao jogo, divididas entre camisetas brancas e o uniforme oficial.
No centro dessa organização está Tatiane Silveira. Tati, como é conhecida pelas jogadoras, tem 48 anos, é contadora, jogadora há cerca de 13 anos e principal líder do time. Naquela noite, Tati declarou que preferia não entrar em quadra, mas permaneceu na área do banco, regendo a partida com incentivos para ambos os lados. Seu papel transcende a gestão do time, que existe desde outubro de 2019 e se reúne tradicionalmente nas terças as 19h30.

Para Tati, a experiência é definida por uma filosofia de bem-estar:
“Não é só futebol, mas troca de experiências, compartilhar momentos, às vezes bons, outras nem tanto, mas estar sempre ativa para ter corpo e mente o mais saudável possível. E com diversão, pois rimos muito, nos cobramos muito e assim vamos todos os dias do horário para jogar futebol feminino”.
O nome do time surgiu em uma das reuniões sociais pós-jogo, durante um jantar cujo cardápio era justamente o prato típico gaúcho. Quando a oficialização do time foi organizada, o termo “Entrevero” foi escolhido por refletir perfeitamente o grupo: um “entrevero de mulheres, meninas, idades variadas e que juntas cada uma com seu jeito toda terça-feira formava time pra jogar”, segundo Tati, que é a única jogadora que está presente desde o início.

Na quadra: futebol, escape e “terapia”
A relevância do Entrevero FC na vida das atletas se manifesta no discurso que coloca o futebol como um elemento essencial de saúde mental e alívio da rotina. Em um grupo com idades e profissões variadas, a quadra é o refúgio.
A goleira Manuela Tresoldi, de 21 anos, é auxiliar veterinária e encontra na quadra a estabilidade de que precisa para equilibrar a rotina:
“O futebol representa paz mental, me ajuda a aguentar a rotina corrida e os dias difíceis, além de um esporte e um time, é uma segunda família.”, destaca Manu.
O sentimento de escape é ecoado por Laila Krech, atendente de farmácia de 25 anos, que vê no coletivo uma ferramenta fundamental para sua qualidade de vida:

“O futebol é meu escape da rotina, ali que eu me divirto e distraio a minha mente, ajuda muito na minha ansiedade. Ainda mais ao lado de pessoas que eu gosto muito, as meninas são muito parceiras e sempre estamos incentivando umas às outras, sem julgamentos.”
Erica Silva, costureira de 27 anos, resume o impacto emocional de maneira direta:
“O futebol sempre foi meu refúgio desde criança… É minha terapia.”
O ambiente acolhedor e livre de julgamentos é um fator de atração, especialmente para novatas como Alessandra Flores, camareira de 31 anos, que joga há apenas quatro meses e resume o que sente pelo esporte como pura “emoção”.
Aqui, o preconceito nunca teve chance
Embora o esporte seja um refúgio, as jogadoras relatam já terem enfrentado comentários negativos e preconceito por serem mulheres no futebol. Manu lembra que quando jogava em times masculinos, alguns jogadores tinham posturas desagradáveis.
“Faziam piadinhas e me tratavam como se fosse mais fraca que eles.”
As críticas, no entanto, nem sempre vem de homens, como destaca Laila:
“Sempre tem [críticas], principalmente homens duvidando da nossa capacidade e entendimento sobre o futebol, ou mulheres achando que jogamos para chamar atenção de outros homens.”


Para Tati, contudo, esse preconceito funciona como combustível. Ela enxerga sua liderança como uma missão de incentivo e empoderamento. Jogadora mais antiga do grupo, destaca um dos seus incentivos:
“Preciso estar com alimentação saudável e o corpo mais resistente para jogar com as meninas mais novas, isto também é muito bom.” e complementa: “A troca de experiência e a vivência com todas me proporciona muitas alegrias”.
Seu maior orgulho reside justamente em ver a força do coletivo feminino que se impõe no esporte, ela reitera que o Entrevero FC é uma resposta direta à sociedade:
“Ainda vivemos em um mundo machista e ver mulheres jogando futebol, muitas vezes melhor que alguns homens, estando incluídas na sociedade como jogadoras, disputando campeonatos, tendo torcidas vibrando e apoiando o time não tem preço.”


Com a presença das crianças nos jogos, o Entrevero FC não só cuida da saúde física e mental de suas integrantes, mas também constrói um futuro de exemplo e possibilidade para as próximas gerações, provando que as adversidades, resistência, união e acolhimento são a principal força do time.
“O futebol começou na minha vida com um intuito de fazer um exercício coletivo para liberar energia e desestressar e hoje posso dizer que o futebol, o convívio com a meninas é mais que somente exercício, é algo que me deixa feliz. (…) Sou muito feliz em poder jogar futebol!”, conclui Tati.
